segunda-feira, 27 de setembro de 2010

JOSÉ CALASANS E OS ESTUDOS DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO - III

OS USOS DA HERANÇA


O trabalho de José Calasans produziu bons resultados. Em 1958, sob os influxos da administração de Anísio Teixeira no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP, o professor José Antônio Nunes Mendonça publicou, pela Livraria Regina, os resultados da sua pesquisa, A educação em Sergipe. Todavia, o seu discurso está fortemente ancorado nos estudos que Calasans realizara anteriormente. O livro História da Educação em Sergipe, de Maria Thétis Nunes, publicado em 1984, pela Editora Paz e Terra, também toma muito das fontes trabalhadas por Calasans para a sua construção discursiva a respeito dos problemas educacionais da província de Sergipe.
O professor José Antônio Nunes Mendonça ao publicar o seu livro, A educação em Sergipe, inaugurou uma espécie de história de introdução na historiografia educacional sergipana. Usou a história sob a perspectiva do presentismo próprio aos estudos feitos à época, sob inspiração de A cultura brasileira, de Fernando de Azevedo , para construir um quadro interpretativo sob o qual a política educacional em Sergipe não fizera nenhum tipo de avanço antes que o grupo do autor sergipano passasse a intervir no palco da tomada de decisões. Ao utilizar a história dessa maneira, o professor Nunes Mendonça renunciou ao modelo historiográfico que fora legado por Calasans e optou por alguns usos da História que apreendera nos seus contatos com intelectuais como Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo, como se explicita na leitura da correspondência que trocava permanentemente com esses dois importantes estudiosos da educação brasileira. Como já foi demonstrado por vários trabalhos, principalmente


Azevedo traçou um percurso da educação no Brasil. Buscou no período jesuítico sua formação. Apontou na reforma pombalina a destruição do educacional então existente. E considerou o período republicano, principalmente fins da década de 1920, como a era da renovação educacional. Caracterizou os primeiros tempos da educação no Brasil como sendo uma fase literária e elitista. O que, segundo o autor só começou a mudar com a reforma educacional de 1928, ocorrida no Distrito Federal. Este fato teria sido responsável pelo caráter cientificista e democrático da educação no Brasil. Note-se que sua obra defendeu que o grupo ao qual o autor pertencia seria o responsável pela inauguração do verdadeiro ensino no país .


Maria Rita de Almeida Toledo afirma que o trabalho de Fernando de Azevedo pode ser definido principalmente pelo seu caráter histórico, posto que os problemas historiográficos não preocupavam o autor. Todavia, Azevedo estabeleceu os parâmetros delimitadores dos estudos sobre Educação que seriam adotados pelas gerações futuras de pesquisadores.
Não obstante as suas dificuldades historiográficas, Nunes Mendonça mantinha em comum com José Calasans a mesma crença, já referenciada, nas potencialidades civilizatórias da Educação. Os estudos de História da Educação realizados pelo professor Nunes Mendonça trazem a forte marca do esperançoso discurso da Pedagogia, carregado das certezas de um vir-a-ser coerente com os projetos que eram formulados. Daí a ênfase ter sido posta naquilo “que deveria ser a realidade e não naquilo que ela é. Essa ligação também gerou uma tendência em explicar os fenômenos educativos do passado por si mesmos, sem nenhuma relação com outros aspectos da sociedade”. Rigorosamente, a produção de Nunes Mendonça foi menos História da Educação e mais Sociologia, Filosofia e Pedagogia. No seu trabalho a História é um processo contínuo que objetiva um fim previamente definido.
Sob a ótica do rigor historiográfico, Maria Thétis Nunes, certamente recebeu uma formação mais refinada que a de Nunes Mendonça. Por isto, mesmo se distanciando de José Calasans do ponto de vista teórico, ela esteve mais próxima na condição de cultora do uso das fontes. Foi com ela que os pesquisadores de História da Educação em Sergipe assumiram as interpretações de caráter marxista em seus textos, a partir de 1962, com a publicação do livro Ensino secundário e sociedade brasileira . Maria Thétis Nunes, a sua autora, era uma aplicada estagiária do Instituto Superior de Estudos Brasileiros – ISEB, no qual se ligou a intelectuais como Nelson Werneck Sodré e Álvaro Vieira Pinto. Apesar desse primeiro livro encontrar dificuldades para continuar circulando no Brasil sob a ditadura militar a partir de 1964, a autora manteve a sua atividade de pesquisadora, trabalhando sob o viés da teoria marxista tal como concebida pela esquerda isebiana. Em 1984, Thétis Nunes publicou a História da Educação em Sergipe, mantendo a mesma perspectiva teórica e o mesmo rigor metodológico que assumira já no estudo de 1962. Historiadora de profissão, ao tratar da Educação sob a perspectiva isebiana, Thétis assumiu o viés interpretativo que diz ser a História fundamentalmente a história das lutas de classes, licenciando-se para, a partir daí, fazer uma série de operações analíticas, nas quais as evidências que extrai das fontes se prestam a localizar as relações entre burguesia e proletariado. Também para identificar os interesses que as classes dominantes defendem. A maior parte dos seus estudos recebeu a marca do determinismo econômico e subordinou o movimento da história exclusivamente às estruturas e à dinâmica da economia.
Na sua interpretação assumiu também os pressupostos da História monumento que Fernando de Azevedo estabeleceu , sob os quais somente se viabiliza uma política educacional consistente no Brasil depois que o campo foi dominado pela ação dos chamados “Pioneiros da Educação Nova”.


Apoiada nos marcos cronológicos estabelecidos por Fernando de Azevedo, lançou seu olhar sobre a legislação referente à educação no período em foco. Para contextualizar o seu objeto se valeu de fontes secundárias (bibliográficas e manuscritas) a fim de apreender o panorama econômico, base do seu estudo. Entendeu que a educação no Brasil, desde as suas origens, se constituiu num transplante de idéias importadas de outras realidades e que, por isso não se ajustavam ao panorama nacional. Dessa forma, afirmou que o Estado sempre abdicou da responsabilidade sobre o sistema educacional. Apoiando-se em sólida base documental, Thétis Nunes interrogou suas fontes de modo a manter a escrita da história dentro do viés econômico determinista. Sua obra é ponto de referência .


Isso reflete o interesse pelo campo da História da Educação e a importância que passou a ter naquela década a pesquisadora Maria Thétis Nunes. Sozinha, até os dias atuais, e partindo da sua posição no Departamento de História da Universidade Federal de Sergipe, ela publicou vinte e três trabalhos sobre o tema. Um deles, o seu livro História da Educação em Sergipe, veio se juntar aos trabalhos anteriormente produzidos por José Calasans e Nunes Mendonça, tornando-se referência obrigatória dentre os estudos sergipanos da área.

sábado, 25 de setembro de 2010

JOSÉ CALASANS E OS ESTUDOS DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO - II

Ao estudar a história do Colégio Imaculada Conceição, no município de Capela, instituição dirigida pelas irmãs concepcionistas, Sandra Maria dos Santos registrou alguns embates que ocorreram entre a equipe que José Calasans integrava e as freiras que comandavam aquela instituição escolar. No livro de crônicas do Colégio, as irmãs escreveram que a equipe comandada pelo professor Arício Fortes chegou de surpresa para uma inspeção: além de não ter havido qualquer prévio aviso, era o dia 17 de março de 1938, data na qual ninguém esperava tal visita, pois Aracaju celebrava naquele ocasião o 83o aniversário da mudança da capital: “o fizeram de um modo grosseiro e desdenhoso nos livros do secretário e nos aposentos da casa destinados às alunas internas e externas”. Estes embates e as queixas que deles ficaram registradas devem ser tomados e entendidos no contexto dos conflitos do período e são reveladores da importância do tipo de trabalho que realizava Calasans naquele momento, como bem diz trecho de uma carta enviada por Alceu Amoroso Lima a Gustavo Capanema no dia 19 de março do ano de 1935: “no terreno da educação, é que se está travando a grande batalha moderna das idéias”.
Calasans procurou revestir a sua atuação profissional no Departamento de Educação de um caráter eminentemente técnico, tal como o fizeram outros intelectuais que trabalharam sob as mesmas circunstâncias em diferentes níveis de governo e regiões do Brasil, a exemplo de Lourenço Filho que dirigiu o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – Inep, como Calasans, também defensor de idéias próprias ao movimento da Escola Nova. O professor sergipano defendia as idéias que Alceu Amoroso Lima considerava “naturalista, materialista, imediatista e estatista”, no dizer de Raquel Gandini, em Intelectuais, Estado e Educação.
Inspecionar as escolas foi importante para o Estado Novo, porque a inspeção se colocou para a administração pública como uma tecnologia que possibilitava o controle, a regulamentação, o reconhecimento e a cassação das atividades das escolas e dos professores. A presença de Calasans no Departamento de Educação se colocava sob o contexto das necessidades dessa política que impôs ao Estado de Sergipe o remanejamento e a reorganização da sua rede de escolas, o aparelhamento dos seus órgãos centrais, a admissão e remoção de professores, coisas que ocorreram na segunda metade da década de 30 e durante a primeira metade do decênio seguinte.


A HISTORIOGRAFIA EDUCACIONAL DE CALASANS


Foi na Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe que circulou o texto do professor José Calasans, “Ensino público em Aracaju – (1830-1871)” . Trata-se da primeira incursão do autor na área. Depois disso, em 1992, o Governo do Estado de Sergipe publicou, através da Fundação Estadual de Cultura – Fundesc, o livro Aracaju e outros temas sergipanos , no qual estão inclusos dois textos do campo da História da Educação: um sobre livros didáticos e um outro enfocando o trabalho do professor Brício Cardoso e o ensino normal em Sergipe.
Do texto de José Calasans que circulou na edição 1949/51 da Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, “Ensino público em Aracaju (1830-1871)”, é possível afirmar ter sido o primeiro estudo de História da Educação em Sergipe que tinha um compromisso com os métodos da História e que buscou entender o processo efetivamente vivido. O rigor metodológico do professor Calasans apontava para a necessidade da construção de uma História da Educação em Aracaju dedicada às instituições educacionais, práticas escolares, movimentos estudantis e outros objetos. Os seus estudos da área são textos fundadores. A partir deles foi periodizada, pela primeira vez, a História da Educação em Aracaju.
O primeiro período que Calasans estabeleceu corresponde aos anos de 1830 a 1855, dando ênfase à mudança da capital da cidade de São Cristóvão para a cidade de Aracaju, fundada no mesmo ano de 1855, e suas implicações na Educação. O segundo período, de 1855 a 1871, faz referência ao ensino masculino, às dificuldades de implantação das cadeiras de Latim, Filosofia e Francês e ao sucesso do ensino feminino. Além de dar importância à figura do professor Brício Cardoso como diretor da Escola Normal, revelando a utilização do método Lancaster ou Monitorial na instituição.
Até agora, seis trabalhos historiográficos voltaram o seu olhar para os estudos de História da Educação em Sergipe realizados por Calasans: o compêndio de Maria Thétis Nunes; um estudo de Anamaria Gonçalves Bueno de Freitas; um de Cristina Almeida Valença; e, três de Jorge Carvalho do Nascimento, dos quais um deles produzido em parceria com Itamar Freitas. Este último texto, intitulado “A temática da educação na Revista do IHGS”, é revelador da importância de José Calasans como estudioso da História da Educação em Sergipe:


O trabalho de José Calasans é (...) o mais importante dentre os que se especializaram na área, durante a primeira metade do século XX. (...) Nos anos 1940, José Calasans já incorporara o discurso que os historiadores do nosso tempo legaram ao campo da História da Educação. O professor Calasans propõe que a história da educação da cidade de Aracaju seja estudada, levando-se em consideração instituições e práticas escolares. No seu tempo, a maior parte dos textos da área privilegiava as idéias pedagógicas e a organização legislativa dos sistemas de ensino. Inversamente, Calasans analisa e dá sentido ao trabalho de professoras e professores primários e secundários; às práticas do ensino público e do ensino privado; à ação estudantil; às experiências pedagógicas; aos edifícios e aos equipamentos escolares.


O fato de o primeiro estudo de História da Educação em Sergipe do qual efetivamente se pode afirmar que tinha um compromisso com os métodos da História e que buscou entender o processo efetivamente vivido ter sido o inaugural artigo do professor José Calasans, “Ensino público em Aracaju (1830-1871)”, de 1951, é por si mais do que suficiente para revelar a importância deste pesquisador da Educação. A sua crença nas potencialidades civilizatórias educacionais, própria da geração dos brasileiros que foram influenciados pelo movimento da Educação Nova, ao lado do seu rigor historiográfico, são indicadores, quando acrescidos dos argumentos até agora esboçados, da necessidade de que é urgente aos pesquisadores de História da Educação a tarefa de estudar com seriedade e profundidade a contribuição de José Calasans.

JOSÉ CALASANS E OS ESTUDOS DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

A partir da década de 50 do século XX, três importantes pesquisadores contribuíram para com a consolidação do campo de estudos da História da Educação em Sergipe: José Calasans, Nunes Mendonça e Maria Thétis Nunes. Tentar compreender hoje como se configura o quadro dos estudos dessa disciplina em Sergipe é dialogar com esta “Santíssima Trindade” de estudiosos e perceber que alguns elementos interpretativos legados por eles continuam presentes na produção historiográfica educacional dos nossos dias. O propósito deste trabalho é verificar um pouco da atuação desses autores e as diferentes leituras que dela foi feita por seguidores e oponentes e as circunstâncias sob as quais as suas contribuições circularam, principalmente a partir do pioneiro trabalho realizado pelo professor José Calasans.
Em 1951, Calasans publicou o artigo “Ensino público em Aracaju – (1830-1871)” , marco fundador do campo sergipano desse tipo de estudo. No final da mesma década, em 1958, foi publicado pela Livraria Regina o livro do professor Nunes Mendonça, A Educação em Sergipe . Em 1962, como estagiária do Instituto Superior de Estudos Brasileiros – ISEB, Maria Thétis Nunes publicou Ensino secundário e sociedade brasileira e, em 1984, como professora do Departamento de História da Universidade Federal, a História da Educação em Sergipe , a única síntese produzida até hoje sobre o assunto.


O PROFESSOR CALASANS


Ainda são incipientes os estudos que têm se debruçado sobre o trabalho de José Calasans como pesquisador da História da Educação. A sua importância como pesquisador da História do Brasil tem chamado a atenção de muitos estudiosos da historiografia brasileira para a obra deste sergipano que passou a maior parte da sua vida produtiva vivendo na cidade de Salvador, onde se vinculou institucionalmente à Universidade Federal da Bahia, na qual chegou a exercer a função de vice-reitor. A produção baiana de José Calasans despertou muita curiosidade, principalmente nos estudiosos dos episódios que envolvem a guerra de Canudos e a saga de Antônio Conselheiro, tema do qual ele se transformou num dos mais importantes dentre os muitos pesquisadores. Não obstante a sua grande contribuição ao campo da História na UFBA, José Calasans deixou registros da sua marca de pesquisador em Sergipe, antes de mudar-se para a Bahia. Esses registros tem sido objeto da preocupação de poucos pesquisadores, é certo, mas de modo crescente vem merecendo reflexões por parte de estudiosos como Maria Thétis Nunes e Luiz Antonio Barreto. Também digno de registro é o trabalho de Carlos Antônio dos Santos, O Senhor da Velha Guarda: notas acerca do pensamento historiográfico de José Calasans. Trata-se de uma monografia apresentada para conclusão do curso de graduação em História da UFS no ano de 1999, sob a orientação da professora Lenalda Andrade Santos.
Nos últimos tempos, a obra de Calasans encontrou em Itamar Freitas um bom inventariante e analista. Ao encerrar uma série de artigos que publicou no jornal Gazeta de Sergipe sob o título “Diálogos com Calasans”, este autor afirma que buscou “demonstrar o valor do trabalho pioneiro de Calasans, tanto em relação à história da historiografia como no esboço do tipo ideal de escrita da história no início dos anos 1970”. Depois de destacar a vida social, a política e a cultura, o analista aqui citado acrescenta a importância da “atividade historiadora em pelo menos três ‘gêneros’ trabalhados por Calasans: historiografia didática, biografia, e história dos municípios”.
Há um aspecto pouco difundido da vida e da obra de José Calasans: as suas contribuições à Educação em Sergipe, tomadas sob três pontos de vista - o do professor, o do administrador da política educacional e o do pesquisador de História da Educação. A preocupação central deste trabalho diz respeito a sua contribuição como historiador da Educação.
Com toda certeza, todos têm conhecimento do óbvio fato de haver Calasans contribuído como professor, posto que esta foi, ao longo da sua vida, a sua mais importante atividade laboral. Mas, quando se trata de dar conteúdo a este aspecto da sua existência, são quase inexistentes os estudos que nos permitam compreender quem foi o professor Calasans, sob quais padrões intelectuais atuou e de que modo se vinculou institucionalmente. Falo não da sua atividade como docente e pesquisador da Universidade Federal da Bahia, mas sim busco os registros do seu trabalho nas instituições escolares de Sergipe, antes da sua mudança para Salvador. Alguns estudos da área indicam que o professor aqui analisado atuou como docente da Escola Normal Rui Barbosa, em Aracaju, a partir da década de 40 do século XX, mas ainda não deram conta de esclarecer o seu trabalho na congregação daquele centro de formação de professores, o programa que oferecia nas disciplinas que ministrava, os livros que adotava, sua relação com os alunos e outros aspectos da sua prática pedagógica. Os estudiosos do campo até agora centraram as suas atenções, ainda que timidamente, apenas sobre a tese de concurso com a qual ele foi aprovado, em 1942, para a cadeira de História do Brasil e de Sergipe: Aracaju: contribuição à História da capital de Sergipe, trabalho publicado no mesmo ano de 1942 pela Livraria Regina.
Como administrador da política educacional, José Calasans integrou a equipe do professor Arício Fortes, quando este dirigiu o Departamento de Educação do Estado de Sergipe. Ao ocupar tal cargo, o diretor geral Arício Fortes se assessorou do professor José Calasans, que ocupou a função de Assistente Técnico. O professor José de Alencar Cardoso, o Zezinho Cardoso, também integrava o núcleo central do poder no Departamento, na condição de Inspetor Geral do Ensino Primário. Eles três, juntos, faziam de dois em dois meses visitas inspecionadoras, sem prévio aviso, a determinados estabelecimentos de ensino. Os estudos de História da Educação em Sergipe ainda não deram conta de esquadrinhar esse período da história das práticas escolares no Estado. Todavia, alguns trabalhos já forneceram indícios que podem permitir uma melhor compreensão da importância que tinham naquele período as práticas de inspeção escolar.
Como intelectual, Calasans participava de um importante órgão administrativo do Estado, o que impõe a necessidade de realização de estudos que auxiliem a compreender a sua visão, o seu papel e a sua relação com a sociedade e com a Educação. Na sua função de Assistente Técnico do Departamento de Educação, Calasans foi um dos profissionais encarregados de propor e fundamentar técnica e cientificamente a política educacional do Estado Novo em Sergipe. Política que nacionalmente sofria fortes influxos do pensamento de Alceu Amoroso Lima, certamente um dos intelectuais que mais opinou durante a gestão de Gustavo Capanema. Isto não significava uma generalização das formas de pensar e agir de todos os agentes intelectuais que desempenhavam os seus papéis técnicos. Assim, não obstante a intransigente defesa do ensino religioso católico feita por Alceu de Amoroso Lima, não foram poucos os conflitos vividos em Sergipe entre José Calasans e os demais membros da equipe do diretor do Departamento de Educação, Arício Fortes, quando juntos tomaram medidas que desagradaram os interesses das instituições escolares mantidas pela Igreja Católica no Estado.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

A REMUNERAÇÃO, OS CONCURSOS E ALGUNS PROFESSORES E PROFESSORAS: ASPECTOS DA PROFISSÃO DOCENTE NA HISTÓRIA DE ARACAJU

A organização do sistema de ensino da nova capital da Província de Sergipe começou em abril de 1855. Naquele ano, em Aracaju, existiam apenas duas Cadeiras de Instrução Primária: uma masculina e outra feminina . Além destas, funcionavam duas Cadeiras de Instrução Secundária: uma de Latim e outra de Filosofia . O Liceu de São Cristóvão foi extinto e a sua Cadeira de Filosofia transferida para Aracaju . Na mesma oportunidade, a cidade ganhou uma Cadeira de Gramática e Língua Latina . A Cadeira de primeiras letras do sexo feminino da vila de Socorro e a Cadeira de primeiras letras do sexo masculino de São Cristóvão foram ambas transferidas para a capital. Além disso, em setembro de 1856, foi criada uma outra Cadeira de primeiras letras para o sexo masculino em Aracaju .
A partir de junho de 1858, o professor Braz Diniz Villas-Boas, já jubilado, assumiu a regência da Cadeira de Latim, ocupando-a até 11 de junho de 1864, quando foi outra vez aposentado . Em julho do mesmo ano de 1864 foram criadas as seguintes Cadeiras de Instrução Secundária: Gramática e Língua Francesa; Gramática e Língua Inglesa; Aritmética, Álgebra e Geometria; Geografia e História; Gramática Filosófica e Análise dos Clássicos; Pedagogia ; Instrução Religiosa; Caligrafia; Noções Gerais de Geometria Plana e Noções sobre Pesos e Medidas do Império . Todos esses cargos deveriam ser providos através de concurso, em exame público prestado perante o presidente da Província. As aulas das novas disciplinas criadas deveriam ser ministradas de segunda a sábado, à exceção dos dias santos e feriados. A Província deveria fornecer as casas e os utensílios necessários às aulas públicas de primeiras letras, enquanto o professor de Pedagogia teria o status de professor de escola normal. No seu programa de trabalho estava prevista uma preleção diária sobre instrução religiosa. Esse mesmo professor deveria inspecionar as aulas de primeiras letras e estimular que os alunos destinados à carreira do magistério atuassem como monitores dos exercícios escolares.
Os futuros professores deveriam fazer estudos complementares de Aritmética, Gramática Filosófica, Geografia e História, Instrução Religiosa, Caligrafia, Noções Gerais de Geometria e Noções sobre Pesos e Medidas do Império. Este programa era exclusivo para os homens. No caso das mulheres que seguiriam a carreira do magistério, era facultado adquirir particularmente o conhecimento das disciplinas “que fazem o objeto do ensino do seu sexo” . Os que pretendiam exercer o magistério elementar, atuando na instrução primária, deveriam realizar os estudos normais complementares durante um período de dois anos.
Todo esse conjunto de providências, prescritas pela Resolução n. 713, de 20 de julho de 1864, tinha dois objetivos: estabelecer uma Escola Normal em Sergipe e extinguir o Liceu Sergipense, que funcionava em São Cristóvão, a antiga capital.
O processo de formação de um sistema de ensino eficaz em Aracaju se ampliou em 1868, com a criação de mais duas Cadeiras do ensino primário: uma do sexo masculino e outra do sexo feminino .
Os professores do ensino primário da Vila de Santo Antônio do Aracaju receberam algumas vantagens, mas tiveram que esperar vinte anos, após a vigência da Resolução 413, de 17 de março de 1855, para gozarem dos mesmos privilégios que eram concedidos aos professores que atuavam na antiga capital da Província, São Cristóvão. Somente em 1875 uma Resolução da Assembléia Provincial concedeu a equiparação . Anteriormente, em 1866, a professora de ensino primário da capital passara a ter os mesmos vencimentos e vantagens do professor do sexo masculino . Para o sexo feminino, mais uma outra Cadeira do ensino primário voltou a ser criada em 1870 . Em 1878, existiam cinco Cadeiras públicas do ensino primário para o sexo feminino, regidas pelas seguintes professoras: Francisca Xavier do Monte Carmelo, no Alto do Pirro; Francina da Glória Muniz Telles, na rua de Japaratuba; Anna Resende Mundim, na Praça da Matriz; Esmeralda Alcina de Barros, na rua de Itabaiana; e, Mathilde d´Oliveira, na casa da Secretaria da Polícia. As cadeiras públicas de ensino primário para o sexo masculino, estavam distribuídas da seguinte maneira: Alexandre José Teixeira, Alto do Pirro; José Avelino de Moraes, na casa da Secretaria da Polícia; e, Cypriano José Pinheiro, na Praça da Matriz .
Durante o último quartel do século XIX, o governo da Província foi pródigo na criação de Cadeiras destinadas ao ensino elementar misto. A criação de tais Cadeiras não significa que meninos e meninas passaram a freqüentar a mesma sala de aula. Na verdade, especificamente misto, era o professor. Essas Cadeiras funcionavam com duas sessões diárias: uma que funcionava das nove às doze horas, destinada aos alunos de um sexo, e outra das duas às cinco horas da tarde, para os alunos do outro sexo .

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A REMUNERAÇÃO, OS CONCURSOS E ALGUNS PROFESSORES E PROFESSORAS: ASPECTOS DA PROFISSÃO DOCENTE NA HISTÓRIA DE ARACAJU

A organização do sistema de ensino da nova capital da Província de Sergipe começou em abril de 1855. Naquele ano, em Aracaju, existiam apenas duas Cadeiras de Instrução Primária: uma masculina e outra feminina . Além destas, funcionavam duas Cadeiras de Instrução Secundária: uma de Latim e outra de Filosofia . O Liceu de São Cristóvão foi extinto e a sua Cadeira de Filosofia transferida para Aracaju . Na mesma oportunidade, a cidade ganhou uma Cadeira de Gramática e Língua Latina . A Cadeira de primeiras letras do sexo feminino da vila de Socorro e a Cadeira de primeiras letras do sexo masculino de São Cristóvão foram ambas transferidas para a capital. Além disso, em setembro de 1856, foi criada uma outra Cadeira de primeiras letras para o sexo masculino em Aracaju .
A partir de junho de 1858, o professor Braz Diniz Villas-Boas, já jubilado, assumiu a regência da Cadeira de Latim, ocupando-a até 11 de junho de 1864, quando foi outra vez aposentado . Em julho do mesmo ano de 1864 foram criadas as seguintes Cadeiras de Instrução Secundária: Gramática e Língua Francesa; Gramática e Língua Inglesa; Aritmética, Álgebra e Geometria; Geografia e História; Gramática Filosófica e Análise dos Clássicos; Pedagogia ; Instrução Religiosa; Caligrafia; Noções Gerais de Geometria Plana e Noções sobre Pesos e Medidas do Império . Todos esses cargos deveriam ser providos através de concurso, em exame público prestado perante o presidente da Província. As aulas das novas disciplinas criadas deveriam ser ministradas de segunda a sábado, à exceção dos dias santos e feriados. A Província deveria fornecer as casas e os utensílios necessários às aulas públicas de primeiras letras, enquanto o professor de Pedagogia teria o status de professor de escola normal. No seu programa de trabalho estava prevista uma preleção diária sobre instrução religiosa. Esse mesmo professor deveria inspecionar as aulas de primeiras letras e estimular que os alunos destinados à carreira do magistério atuassem como monitores dos exercícios escolares.
Os futuros professores deveriam fazer estudos complementares de Aritmética, Gramática Filosófica, Geografia e História, Instrução Religiosa, Caligrafia, Noções Gerais de Geometria e Noções sobre Pesos e Medidas do Império. Este programa era exclusivo para os homens. No caso das mulheres que seguiriam a carreira do magistério, era facultado adquirir particularmente o conhecimento das disciplinas “que fazem o objeto do ensino do seu sexo” . Os que pretendiam exercer o magistério elementar, atuando na instrução primária, deveriam realizar os estudos normais complementares durante um período de dois anos.
Todo esse conjunto de providências, prescritas pela Resolução n. 713, de 20 de julho de 1864, tinha dois objetivos: estabelecer uma Escola Normal em Sergipe e extinguir o Liceu Sergipense, que funcionava em São Cristóvão, a antiga capital.
O processo de formação de um sistema de ensino eficaz em Aracaju se ampliou em 1868, com a criação de mais duas Cadeiras do ensino primário: uma do sexo masculino e outra do sexo feminino .
Os professores do ensino primário da Vila de Santo Antônio do Aracaju receberam algumas vantagens, mas tiveram que esperar vinte anos, após a vigência da Resolução 413, de 17 de março de 1855, para gozarem dos mesmos privilégios que eram concedidos aos professores que atuavam na antiga capital da Província, São Cristóvão. Somente em 1875 uma Resolução da Assembléia Provincial concedeu a equiparação . Anteriormente, em 1866, a professora de ensino primário da capital passara a ter os mesmos vencimentos e vantagens do professor do sexo masculino . Para o sexo feminino, mais uma outra Cadeira do ensino primário voltou a ser criada em 1870 . Em 1878, existiam cinco Cadeiras públicas do ensino primário para o sexo feminino, regidas pelas seguintes professoras: Francisca Xavier do Monte Carmelo, no Alto do Pirro; Francina da Glória Muniz Telles, na rua de Japaratuba; Anna Resende Mundim, na Praça da Matriz; Esmeralda Alcina de Barros, na rua de Itabaiana; e, Mathilde d´Oliveira, na casa da Secretaria da Polícia. As cadeiras públicas de ensino primário para o sexo masculino, estavam distribuídas da seguinte maneira: Alexandre José Teixeira, Alto do Pirro; José Avelino de Moraes, na casa da Secretaria da Polícia; e, Cypriano José Pinheiro, na Praça da Matriz .
Durante o último quartel do século XIX, o governo da Província foi pródigo na criação de Cadeiras destinadas ao ensino elementar misto. A criação de tais Cadeiras não significa que meninos e meninas passaram a freqüentar a mesma sala de aula. Na verdade, especificamente misto, era o professor. Essas Cadeiras funcionavam com duas sessões diárias: uma que funcionava das nove às doze horas, destinada aos alunos de um sexo, e outra das duas às cinco horas da tarde, para os alunos do outro sexo .

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

ALFREDO MONTES E O PRIMEIRO CONCURSO PARA A CADEIRA DE INGLÊS DO ATHENEU SERGIPENSE

Apesar de o Atheneu Sergipense, instalado em 1871, haver realizado o seu primeiro concurso público para o cargo de Lente no ano de 1875, os dois professores que dele participaram e obtiveram aprovação já integravam a sua Congregação: Pedro Oliveira de Andrade, na Cadeira de Geometria, e José João de Araújo Lima, na Cadeira de História Universal. Em 1877, aconteceu pela primeira vez no Atheneu um concurso que admitiu ao cargo de Lente um professor que não pertencia ao seu corpo docente: Alfredo de Siqueira Montes, na Cadeira de Inglês.
Ascendino Ângelo dos Reis, Raphael Archanjo de Moura Mattos e Pedro Oliveira de Andrade integraram a banca examinadora, que decidiu por uma lista de dezessete pontos para que os candidatos pudessem elaborar, num prazo de quinze dias, a tese que, obrigatoriamente, deveria ser apresentada por cada candidato, nos termos definidos pelo Regimento que vigorou a partir do início do mesmo ano de 1877: 1º - Filiação da língua inglesa, suas afinidades e relação com outras línguas; 2º - Dialetos Ingleses; 3º - Índole da língua inglesa em relação à portuguesa, analogias e dessemelhanças; 4º - Estrutura e mecanismo da língua inglesa; 5º - A língua inglesa nos diferentes países de seu desenvolvimento; 6º - Artigos ingleses e seus empregos; 7º - Formas numéricas dos nomes ingleses; 8º - Formas genéricas dos nomes ingleses; 9º - Maneiras de indicar em inglês o complemento restritivo português; 10º - Comparativos e surperlativos ingleses, sua formação; 11º - Modos e tempos verbais, sua formação e seu valor; 12º - Conjugações verbais; 13º - Irregularidades dos verbos; 14º - Pronomes e adjetivos pronominais; 15º - Regência das palavras variáveis; 16º - Regências das palavras invariáveis; 17º - Inglês e inglês americano, suas literaturas e representantes.
A banca examinadora definiu também o ponto para a prova escrita: Versão de um trecho dos clássicos da língua portuguesa para a inglesa, extraído de qualquer obra adaptada pelo programa dos exames gerais, sendo por sorteio tanto a obra como a página.
As provas do concurso foram realizadas durante dois dias consecutivos e tiveram início às dez horas do dia 22 de junho de 1877, no salão nobre da Assembléia Provincial, sob a presidência do diretor da Instrução Pública, Pelino de Carvalho Nobre. Além dos membros da banca examinadora, estavam presentes à sessão os Lentes Antônio Diniz Barretto, Tito Souto, Geminiano Paes Andrade e Brício Cardoso. Dos dois candidatos inscritos, o primeiro a defender a sua tese foi Hormecindo Leite de Mello, acadêmico do quinto ano da Escola de Medicina da Bahia. O seu concorrente era o professor Alfredo de Siqueira Montes, Chefe de Seção da Secretaria do Governo, que fez a sua defesa em seguida. Ambos os candidatos foram argüidos, durante cerca de 40 minutos cada um deles, pelo examinador Ascendino Ângelo dos Reis. Os examinadores Raphael Archanjo de Moura Mattos e Pedro Oliveira de Andrada optaram pela renúncia ao direito que tinham de argüir os candidatos, declarando-se contemplados com a argüição do professor Ascendino. Depois de haver sido suspensa a sessão durante 15 minutos, o professor Moura Mattos fez a leitura de um texto da Seleta a ser traduzido pelos candidatos, iniciando assim a prova escrita, que teve a duração de duas horas, seguida de um debate de 30 minutos, com cada candidato.
As provas do dia começaram pelas apresentações orais dos dois candidatos. O Regimento permitia que os candidatos se argüissem mutuamente, o que provocou um conflito entre ambos. Alfredo Montes acusou Hormecindo Mello de ser uma pessoa sem modos e afirmou não estar disposto a tratar com alguém assim, recusando-se a argüi-lo e permanecendo calado quando foi argüido por este. A polêmica entre ambos serve para demonstrar o acirramento da competição pelo poder político presente nos concursos para a prestigiosa posição de Lente da Congregação do Atheneu Sergipense. Hormecindo Mello era estudante de Medicina na Bahia, enquanto Alfredo Montes exercia já um cargo de muito prestígio na vida política da província de Sergipe: o de chefe de seção da Secretaria de Governo. A Congregação aprovou a este, mesmo tendo ele optado por permanecer em silêncio durante uma etapa das provas e ter o seu oponente respondido a todas as questões e apresentado as suas, conforme determinava o Regimento.
Alfredo Montes foi empossado no cargo de Lente do Atheneu no dia três de julho de 1877, apenas dez dias após o encerramento do concurso, numa solenidade que foi um ato político da maior repercussão e ao qual estiveram presentes o próprio presidente da Província, José Martins Fontes, e o diretor da Instrução Pública, Pelino Francisco de Carvalho Nobre, além de lentes, professores, intelectuais e políticos como Brício Cardoso, Raphael Archanjo de Moura Mattos, Ascendino Ângelo dos Reis, Pedro de Andrada, Geminiano Paes de Azevedo, Antonio Diniz Barreto, Oseas de Oliveira Cardoso, Jesuíno José Gomes, Manuel Francisco d’Oliveira, Severiano Cardoso, José Malhado de Araújo, Simião da Motta, Antonio José, Jason Valladão, Baltasar Viera de Melo, Feliciano Francisco da Rocha, José Honorino de Oliveira, Savino Roiz Cotias, Rodolfo Ramos Fontes, Manoel Mendes da Costa Filho, Manoel dos Passos de Oliveira Telles, Godofredo de Mello Barrêtto do Nascimento e Francisco de Paula Freire, dentre outros.
Alfredo Montes se transformou em um dos mais importantes dentre os lentes do Atheneu Sergipense. Participou das comissões de exames finais de Inglês, Francês, Latim, Português, Geografia e Filosofia e em 1882 foi eleito secretário da Congregação. Após a sua morte, em agosto de 1906, ele recebeu uma homenagem proposta pelos alunos Gentil Tavares da Motta, José da Rocha Teixeira, Paulo da Rocha Teixeira, Clarindo Diniz Gonçalves, Clodomir Silva e Martins de Camacho. Por sugestão desses estudantes, no dia 18 de maio de 1910 foi inaugurado um retrato seu no salão nobre do Atheneu Sergipense, em solenidade que contou com a presença do presidente do Estado de Sergipe, Rodrigues Dória.

sábado, 18 de setembro de 2010

OS PROCESSOS SUCESSÓRIOS DA ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SÃO CRISTÓVÃO - IV

O nome mais votado da lista foi o do professor Alberto Aciole Bonfim. Alfredo Franco Cabral saiu da eleição em segundo lugar. O terceiro foi Manoel Luiz. O primeiro foi nomeado para dirigir a escola . Porém, três dias após a sua nomeação, a portaria de designação foi tornada sem efeito, em face de gestões realizadas junto ao ministro da Educação pelo senador Lourival Baptista e pelo governador Antônio Carlos Valadares . Com isto, foi publicada uma nova portaria designando para o exercício da função o professor Alfredo Franco Cabral . Alberto Aciole Bonfim recorreu à Justiça Federal contra o ato do ministro e um ano depois foi reintegrado no cargo .
Sgundo o professor Alberto Aciole Bonfim, o episódio não deixou seqüelas na vida da Escola:


Eu consegui, junto com o professor Alfredo, um relacionamento tal que servisse de exemplo aos demais que fazem a instituição. Não poderia continuar sendo uma instituição polarizada - metade briga por Alberto e metade briga por Alfredo ou outra pessoa. Nós achamos por bem que tínhamos de servir de exemplo eu e ele. Tanto é que, oito anos depois, quando eu coloquei meu nome novamente para ser candidato a diretor da Escola, eu tive a satisfação de receber o voto dele como membro do Conselho me apoiando para a direção da Escola .


O professor Alfredo Cabral concorda apenas em parte com a interpretação de Alberto Aciole Bonfim:


Toda eleição sempre fica [ressentimento]. Na hora que vai para a lista e qualquer um pode ser nomeado começa a ter briga, começa a criar aquele ambiente ruim. A Escola ficou dividida em dois grupos: o grupo de Alberto e o grupo de Alfredo. Sempre me dei com ele. Agora, tanto eu como ele, gato e cachorro, era um olhando para a cara do outro meio desconfiado. Quando eu perdi entreguei. Eu olho a escola com uma visão e ele olha de outra. Ele passou esses quatro anos, não teve problemas. Não tenho ressentimento contra ninguém, nem contra ele .


O açodamento da relação entre ambos teria se acentuado em função de uma decisão do diretor Alberto Aciole Bonfim que pareceu injusta à ótica de Alfredo Cabral:


Alberto me deixou chocado. Ele me tirou do aviário e me colocou em bovino. Tudo bem, eu sou veterinário e não posso reclamar. Mas, eu acho que o aluno de aviário perdeu e o aluno de bovino perdeu. Eu já estava com uns dez a doze anos em avicultura e o professor de bovino também já estava com seus dez a doze anos. O de lá tinha que ficar perguntando e eu tinha que ficar perguntando a ele. Eu, em sala de aula, disse isso e ele disse isso. Que íamos nos esforçar ao máximo para não prejudicar eles [os alunos]. Fiz apostilas. Fiz veterinária, não sou burro. Estudei e busquei relembrar. Mas eu também tenho meus pés no chão. Não vou dizer que sou o melhor veterinário de avicultura do país, porque se eu fosse não estaria aqui, eu estaria dando palestras, estaria nos Estados Unidos. A gente tem que sentir até onde pode ir. Foi o meu caso de bovino. Eu disse que ia dar aula, fiz apostila, fiz tudo. Agora, na hora que chegou detalhe técnico, inseminação artificial... Isso tinha quinze a dezoito anos que eu tinha visto na universidade. Aí eu pedia para meu colega me dar um curso. Mas foi dito ao aluno. Não estou dizendo que Alberto está me botando de castigo não, mas eu achei que foi. Um ano depois ele me mudou. Ele achou que especialista em avicultura tem que ficar em avicultura. Isso aí foi uma coisa que não precisava .


Problemas sucessórios idênticos voltariam a ocorrer quatro anos depois, ao final da gestão de Alberto Aciole Bonfim. No processo eleitoral que se instalou Alfredo Cabral concorreu novamente. Foi o primeiro da lista, mas não conseguiu a nomeação. “A professora Cláudia teve dez por cento dos votos e acabou ganhando porque é indicação do ministro. Não interessa voto mesmo” . A gestão da professora Cláudia foi bastante tumultuada do ponto de vista administrativo, levando a Escola a mergulhar numa grave crise.
No final da década de 90, as disputas haviam se acirrado a tal ponto que a Escola estava mergulhada em uma situação muito difícil. Em alguns anos, foi oferecida uma quantidade de vagas maior que o número de candidatos à matrícula nos seus cursos.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

OS PROCESSOS SUCESSÓRIOS DA ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SÃO CRISTÓVÃO - III

Para Alfredo Cabral, a decadência existe e é de natureza técnico-pedagógica:


A Escola piorou. A Escola hoje compra farinha. A Escola tem uma área de 2.500 tarefas a quinze quilômetros de Aracaju, tem rio, tem mão-de-obra, tem tratorista, tem trator, tem o próprio aluno também. A Escola hoje não planta mandioca. Começaram a plantar esse ano. Tem muito tempo que não planta, desde a época de Alberto, na primeira gestão. Alberto não chegou a plantar arroz. Acho que o último arroz que foi plantado foi quando eu fui diretor, em 89. O arroz não planta. Horta, produz um pouquinho. Aviário é como eu falei para você, ficou dois anos parado. O aperto na Educação pública é geral, mas nunca faltou dinheiro. Qual foi o órgão [público] que você viu fechar por falta de dinheiro nesse país? Nunca, tem dinheiro. Tem pouco, mal aplicado. Alberto mesmo, na primeira gestão, pintou o prédio da administração, se não me engano, quatro vezes. Aquilo ali ficava um brinco. Mas, se você fosse lá pra trás, para o aviário, não estava bom. Então é uma questão administrativa. Se você entra lá e é professor de Educação Física e quer investir em esporte, você vai investir em esporte. Quadra, isso, aquilo, tudo vai ficar bonitinho. Mas, vá olhar o campo. Eu acho que aquela Escola é uma Escola agrícola. (...) É [necessário] mudar o currículo. A gente se preocupa. O aluno basta aprender Matemática que já vai para o campo. Não. É regra de três, é? Saber quantos quilos de adubo vai dar em cada tarefa? Não. O que eu acho que está decadente é isso. A Escola já foi ponto de referência. Nós já produzimos pinto de um dia. Tinha suíno lá que era ponto de referencia, que era como se fosse um fomento. O cara ia comprar para criar, porque o porco era bom. Hoje é o contrário. O porco faz vergonha. Tem vaca lá que produz um litro, dois litros de leite. Isso é uma cabra. Mas é o que nós temos. Que caiu, caiu e muito, não caiu pouco não .


Com a tese da decadência também concorda a professora Umbelina Aciole de Bonfim , atribuindo a responsabilidade aos gestores que passaram pela instituição: “A Escola está decadente porque ela passou por mãos não habilitadas para [gerenciar] o ensino de nível médio” . Nessa pluralidade de diagnósticos, a opinião do professor Emanoel Franco é a de que a decadência da Escola se deve ao fato de a instituição não haver optado pelo ensino superior . O atual diretor da Escola, Alberto Aciole Bonfim, diverge completamente da idéia de que a instituição estaria decadente.


A escola de São Cristóvão é uma escola que sempre proporcionou aos jovens do hinterland sergipano oportunidade de crescimento. Se você diz que ela está em decadência, eu pergunto: por que? Ela está fechando ou vai fechar algum curso? A Escola está oferecendo três cursos, (...) aceita alunos internos, aceita alunos semi-internos e aceita alunos externos. [Aceita] alunos que já terminaram [o ensino médio], não conseguiram [aprovação] no [concurso] vestibular [para o ensino superior] e têm oportunidade de fazer um curso de agroindústria, de agricultura ou de zootecnia. Por que eu vou dizer que a Escola regrediu? Em hipótese alguma. A Escola está a cada dia crescendo e precisa de pessoas que apóiem esse desenvolvimento .


O processo de escolha do diretor da Escola Agrotécnica Federal de São Cristóvão pela comunidade escolar começou na década de 80, de modo tumultuado e sob muita polêmica. O governo federal definira que as escolas agrotécnicas poderiam fazer um processo de eleição paritária entre os três segmentos da comunidade escolar para a composição de uma lista sêxtupla de nomes . A lista seria encaminhada ao Ministério da Educação que escolheria um dos seis. Ao final da gestão do professor Francisco Gonçalves, em 1988, foi feita a primeira eleição na escola . O processo foi bastante tumultuado, desde o início. Seis candidatos disputaram o pleito. Dentre estes, os nomes mais fortes eram os de Alberto Aciole Bonfim, Manoel Luiz e Alfredo Cabral. O debate eleitoral ficou polarizado entre os professores da chamada área técnica e os professores licenciados. O grupo da chamada área técnica recolocou o velho debate segundo o qual somente os agrônomos e veterinários teriam condições de dirigir a instituição. O professor Alfredo Cabral, veterinário por formação, encarnou a liderança que representava este pensamento. Manoel Luiz, professor de Educação Física, era a expressão dos professores licenciados, enquanto Alberto Aciole Bonfim, professor licenciado de Biologia e vice-diretor durante a gestão de Francisco Gonçalves, era visto como o candidato que possuía experiência nos setores técnico-administrativos.
Alfredo Cabral, apesar de haver representado no processo eleitoral o grupo da área técnica, entende que esta condição não é requisito indispensável para dirigir a Escola:


Não é que a escola tenha obrigação [de ser dirigida por alguém] da área técnica. Pode ser de qualquer área, porque na realidade ali o que o [diretor] assume é uma administração. Ele tem que se cercar de pessoas boas de cada setor. Eu senti que fui bem aceito pelos estudantes que tinham direito a voto, uma boa parte dos funcionários e professores. Como eu sou da parte técnica passava mais tempo no setor do que na sala dos professores. A grande maioria dos professores era do ensino médio, não era da área técnica .


Muitas pessoas, à época estranharam o fato de Alfredo Cabral haver registrado a sua candidatura e pregar, no interior da Escola, durante a campanha que era contra a realização do pleito.


Eu fui contra a eleição, porque a eleição era para colocar seis nomes [em uma lista a ser enviada ao MEC]. Na época só tinham seis nomes [registrados como candidatos]. Então não precisava fazer eleição. Só era botar os nomes [na lista] e mandar. Agora, se tivesse sete, aí sim, porque um tinha que ser descartado. Eu fui contra [a realização da eleição]. Teve um debate, Alberto propôs que quem saísse em primeiro lugar era o diretor. Eu fui contra perante todo mundo. Eu disse que era contra porque ele não havia se afastado, continuou no cargo. Ele era vice-diretor. Quando entra numa eleição, queira ou não queira, começa aquela ajuda de voto. O funcionário precisa se ausentar por três dias, aí se libera; o aluno, não suspende, vai ajeitando... E eu não. Eu só fazia a parte pior, que era pegar aluno, botar aluno para trabalhar e cobrar dele, o trabalho e o ensino, o estudo. Eu fui contra perante todo mundo .

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

OS PROCESSOS SUCESSÓRIOS DA ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SÃO CRISTÓVÃO - II

A exoneração de Laonte Gama da Silva do cargo de diretor da Escola Agrotécnica Federal de São Cristóvão era esperada desde muitos anos . Ao longo dos dezesseis anos nos quais exerceu a função, vários grupos e líderes da política de Sergipe fizeram pressão para substituí-lo. Dentre outros problemas de natureza política apontados no comportamento do diretor, estava o fato de ser este notoriamente ligado ao Movimento Democrático Brasileiro – MDB , partido que fazia oposição ao governo ditatorial. Em várias ocasiões, além da acusação de oposicionista Laonte Gama recebeu a pecha de simpatizante da causa comunista, como nas eleições de 1974, quando o provecto senador Leandro Maciel perdeu a sua cadeira para o médico João Gilvan Rocha e “aproveitou a oportunidade para informar que eram comunistas o bispo de Propriá, o chefe do distrito da Superintendência do Vale do São Francisco e o diretor de uma escola agrícola federal” .
Quanto ao processo de escolha do diretor da Escola através de eleições diretas envolvendo docentes, discentes e os servidores técnico-administrativos, Laonte assevera ser este um processo visto por ele com restrições. Na sua opinião, somente os engenheiros agrônomos possuem os requisitos técnicos necessários à gestão da Escola Agrotécnica Federal de São Cristóvão.
Essa questão, porém, é polêmica no interior do corpo docente da Escola, mesmo entre pessoas que estão muito próximas. A professora Gilda Vasconcelos Gama da Silva considera a experiência da eleição direta para diretor muito ruim, entendendo que se estabelece uma relação de troca de favores que prejudica o funcionamento da atividade fim. Depois que se inaugurou este processo eleitoral, “o próprio Ministério da Educação criou mais de quarenta funções gratificadas” .
O ex-diretor Tennyson Aragão considera que o atual processo de escolha dos gestores da Escola Agrotécnica Federal de São Cristóvão “é uma palhaçada. O diretor tem que ser escolhido pela autoridade do Ministério a quem ele vai ficar subordinado. Isso está superado” .
No início do século XXI, o discurso sobre as relações de poder no interior da Escola buscou valorizar padrões de gerenciamento tidos como democráticos e definir os elementos necessários à sua implementação. “A consolidação de uma gestão escolar de cunho democrático-participativo requer competências cognitivas e afetivas, respaldadas na internalização de valores, hábitos, atitudes e conhecimentos” .
Mesmo não concordando com o novo método de escolha dos dirigentes da instituição, Laonte Gama da Silva tende a discordar de um entendimento muito difundo dentre os profissionais da área segundo o qual o atual processo de eleições diretas para diretor seria o grande responsável pelo que boa parte dos entrevistados para este estudo foi unânime em apontar: aquilo que consideram a decadência da Escola Agrotécnica Federal de São Cristóvão. Afirmando estar a Escola decadente, ele atribui o fato não apenas ao processo eleitoral interno, mas diz que na verdade o atual modelo brasileiro de formação de técnicos agrícolas está esgotado. “Esse modelo já faliu” . Crê que a decadência da Escola tanto pode ser resultante do modelo brasileiro de ensino médio, do modelo de ensino agrícola, quanto a fatores internos da própria administração e do pessoal da instituição. Sustenta sua crítica aos fatores internos da Escola, exemplificando:


Foi imperdoável a ausência da Escola quando o governador João Alves lançou o projeto Platô de Neópolis. Ela tinha que gritar, estar junto da Secretaria da Agricultura. A Escola tem que participar do projeto. Um agricultor para irrigação é um agricultor especializado .


Aliás, o tema da decadência se repetiu várias vezes ao longo da história da instituição escolar:


Esta Escola é um estabelecimento de tradição pelos bons e relevantes serviços que vem prestando a toda coletividade e não pode nem deve parar. Sua curva deve ser sempre ascendente e nunca como agora, estacionária ou mesmo descendente. Mas, é isto mesmo; as instituições assim como as pessoas estão sujeitas aos altos e baixos da sorte, mas, aquelas que conseguem sobreviver às intempéries do destino voltam à plenitude do seu antigo progresso. Não somos derrotistas nem desfalecemos diante da rudeza das lides diárias. Prevemos para este Educandário um futuro promissor devido às suas grandes possibilidades que um dia serão despertadas pelo toque mágico dos idealistas que dirigem os destinos da nossa Pátria. E, quer estejamos nós ou outros na direção dos seus trabalhos, esta Escola emergirá vitoriosa desta tremenda crise que ora lhe vem assolando .


Outro ex-diretor da escola que a considera decadente é o professor Tennyson Aragão: “As poucas vezes que eu vou lá eu fico triste de ver a escola, como ela está. O auditório não existe mais. E, para fazer aquele auditório não foi fácil. Foi um trabalho meu e do João Fernandes” . Para ele a decadência se deve ao despreparo administrativo de alguns dos diretores que passaram pela escola.
Com a idéia da decadência concordam também alguns dos seus ex-alunos. José Ireno da Silva que freqüentou a instituição durante a década de 80 atribui o processo de decadência ao que considera o afrouxamento das normas disciplinares . Além disso, ele considera também a mudança do perfil do mercado de trabalho, entendendo que a profissão de técnico agrícola perdeu importância .

domingo, 12 de setembro de 2010

OS PROCESSOS SUCESSÓRIOS DA ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SÃO CRISTÓVÃO

Desde que a instituição foi criada, em 1924, os processos sucessórios na sua direção foram freqüentemente traumáticos. Aquele que se afastava da direção não poupava críticas a quem lhe sucedia. Da mesma maneira, nos momentos em que um diretor assumia o cargo era comum dirigir acusações ao seu antecessor. Domingos Rodrigues, que assumiu a direção do Patronato de Menores Francisco de Sá, em 13 de dezembro de 1927, carregou nas tintas do seu Relatório: “Achando-se na época em que recebi do meu antecessor, o patronato em completa desorganização, era impossível dentro de tão pequeno lapso de tempo, já ter conseguido obra perfeita, com resultados surpreendentes e maravilhosos” .
Invariavelmente, a mudança do diretor ocorria quando o grupo que exercia o poder era substituído por um novo bloco partidário. “Em 1954 o diretor era João Fernandes de Sousa. Entrou Dr. Leandro [Maciel] para o governo e tirou João Fernandes. Ele era ligado ao pessoal do PSD. O grupo de Dr. Leandro não se afinava com João Fernandes” . Os dois diretores que sucederam a João Fernandes de Sousa eram intimamente ligados à UDN: Wanderley do Prado Barreto e Tennyson Araújo Aragão. A UDN somente perdeu o controle da indicação dos diretores da instituição depois que João de Seixas Dória venceu as eleições, em 07 de outubro de 1962.
Nos últimos anos da ditadura militar as relações de poder faziam com que se explicitassem cada vez mais as divergências no interior da Escola. O ponto máximo de tensão ocorreu quando da substituição do diretor Laonte Gama da Silva, depois de haver este exercido a função durante 16 anos . Após a sua saída, a instituição passaria por mudanças administrativas radicais, posto que pela primeira vez seria gerenciada por um técnico sem formação superior. Os engenheiros agrônomos estariam, a partir de então, alijados do exercício do poder na Escola. Não mais tiveram condições de indicar o diretor. Além do mais, incomodava a alguns deles o fato de o novo diretor ser um técnico com formação em nível médio: Francisco Gonçalves. Laonte Gama da Silva revela o grau de tensão produzido por tais conflitos, ao acusar o seu sucessor de haver desmontado a indústria de laticínios que ele deixou funcionando na Escola.
Ele atribui a um ex-governador sergipano a responsabilidade pelas alterações na administração da Escola:


nós saímos da Escola por uma exigência do governador Augusto Franco . O Senhor de Engenho e o processo de puxa-saquismo. O secretário geral do MEC foi ao Ministro Jarbas Passarinho e pediu para que não me demitisse, o diretor geral do Ensino Agrícola foi a ele e pediu para que não me demitisse. A resposta do ministro: é para atender o governador. Dos três senadores de Sergipe, dois queriam a substituição: Passos Porto e Lourival Baptista. [Um] era contra: Gilvan [Rocha] .


Vários professores da Escola confirmam a interpretação feita por Laonte Gama . Contudo, mesmo concordando com as avaliações feitas por Laonte Gama a respeito do processo da sua demissão e substituição por Francisco Gonçalves, muitas pessoas consideram que ela carrega nas tintas ao afirmar que saiu em face de problemas políticos, por entenderam que nunca, na história da instituição fora distinto esse tipo de processo, inclusive quando da nomeação do próprio Laonte Gama:


Laonte passou o seu período como se fosse um período de ditadura. Ele não passou quatro anos nem foi eleito. Politicamente Dr. Leandro [Maciel, líder político da UDN] caiu. Tiraram Wanderley [do Prado Barreto]. Foi politicamente que ele entrou ali. Laonte foi morar na casa grande, que era uma casa muito boa, muito equipada e aí ele se fez dono da escola. (...) Embora ele tenha criado o Conselho de Professores, a palavra final era dele .


Entretanto, há professores que avaliam com muito entusiasmo os dezesseis anos durante os quais Laonte Gama dirigiu a instituição. Para Emanoel Franco, ele qualificou o quadro de professores e “foi um grande diretor” . Laonte Gama da Silva revelou toda a sua mágoa para com o processo de substituição do diretor, principalmente considerando o fato de que pela primeira vez a Escola foi administrada por um técnico agrícola com formação em nível médio e não por um engenheiro agrônomo, como vinha ocorrendo desde 1924:


Eu pedi para sair da AEASE . Existe uma tradição dessa Escola. Desde que essa Escola passou a ser ensino. [O cargo de diretor] só foi ocupado por engenheiro agrônomo, nunca por um técnico agrícola. Põe um engenheiro agrônomo. A AEASE não tomou conhecimento .

sábado, 11 de setembro de 2010

AGRÔNOMOS X DOCENTES: MEMÓRIAS DAS DISPUTAS PELO PODER NA ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SÃO CRISTÓVÃO

O entendimento era o de que a Escola se relacionava com os proprietários rurais a fim de melhorar os padrões da agricultura e da pecuária do Estado por meio da colaboração técnica às propriedades rurais .
A prestação de serviços foi outra estratégia também muito utilizada pelo Colégio para angariar prestígio junto à população. Na década de 50 o Centro Social Graccho Cardoso promovia palestras semanais destinadas a comunidades próximas à escola. Com a participação de professores e alunos, as palestras, sempre noturnas, incluíam também a exibição de um filme . No final da década de 60, o então diretor Laonte Gama da Silva considerava importante aproximar a escola das pessoas em geral.


Eu abri loja de venda aqui dentro. De ovos, de feira. Aqui dentro da Escola eu tinha isso, tinha sexta-feira verde. No Siqueira Campos, na [rua] Carlos Corrêa. Eu tinha sexta-feira verde na Escola, o povo daqui de Aracaju ia para lá comprar. Tinha carne de porco, tinha isso. Eu, quando deixei a Escola eu deixei dois reprodutores .


Este mesmo entendimento tiveram os dirigentes da instituição que o antecederam e os que exerceram a função em períodos posteriores. Qualquer atividade que fizesse a Escola aparecer junto à opinião pública como um local onde os estudantes recebiam uma boa formação e aprendiam a aprender era importante para expor objetos e gêneros alimentícios ali produzidos .
Dentre as estratégias de legitimação do poder da escola também se incluía a necessidade de apresentar resultados junto ao Ministério da Educação. Por isto, sempre que possível, era necessário mostrar às autoridades federais responsáveis pelo ensino agrícola e aos docentes e dirigentes de outras escolas o trabalho realizado na instituição. Com este objetivo, todos os espaços que se pudessem ocupar eram válidos. Da mesma maneira que era fundamental aprender com a experiência das demais instituições . Todo e qualquer evento que se realizasse no país servia para a organização de exposições com objetos produzidos nas escolas agrotécnicas .
Periodicamente, a partir da década de 60, o Colégio Agrícola Benjamin Constant organizava eventos que contribuíam para com a formação cívica e atraíam, para o seu espaço, familiares dos alunos e autoridades, além de docentes e dirigentes de outras congêneres .
Tudo isto, porém, não impediu que houvesse uma tentativa de estadualização do Colégio, em 1978. O secretário da educação do Estado de Sergipe, Everaldo Aragão Prado, mandou fazer uma avaliação da escola com o objetivo de incorporá-la à rede de escolas públicas estaduais. A iniciativa era estimulada pelo próprio Ministério da Educação, porque havia o entendimento de que o ensino de segundo grau deveria ser completamente responsabilidade dos governos estaduais, ficando a União federal apenas com os encargos do ensino superior. Esta era, então, a interpretação que tanto o Governo de Sergipe quanto o Governo Federal faziam dos dispositivos da lei 5.692/71, que regulava a matéria. Era o mesmo processo que observado, com avanços e recuos, em colégios agrícolas mantidos pelo Ministério da Educação em outros Estados. A situação avançou mais no Estado do Rio Grande do Norte, onde a escola federal foi transferida para o governo estadual, encerrando suas atividades alguns anos depois. “Não existe mais escola agrícola federal no Rio Grande do Norte” . Em Sergipe, Laonte Gama da Silva afirma haver liderado um movimento contrário à estadualização do Colégio Benjamin Constant. “Eu pressionei por A + B [alegando que] com os recursos que a secretaria da Educação tinha” seria impossível manter o ensino agrícola funcionando. “Eu era inclusive do Conselho Estadual de Educação. Eu movimentei o Conselho Estadual de Educação e provei por A + B que não tinha condições de fazer aquilo porque é melhor não formar o mau profissional” . O bispo de Própria, D. José Brandão de Castro, buscou mediar o conflito, colocando à disposição do Governo do Estado de Sergipe o Colégio Nossa Senhora das Graças, naquele município, afirmando que a Diocese concordava com a sua estadualização e transformação em escola agrotécnica.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

AGRÔNOMOS X DOCENTES: MEMÓRIAS DAS DISPUTAS PELO PODER NA ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SÃO CRISTÓVÃO

Funcionando com os recursos do orçamento dos Ministérios da Agricultura e da Educação, a instituição raramente podia contar com o auxílio financeiro dos governos do Estado e de municípios que se beneficiavam diretamente da sua ação, como São Cristóvão, Nossa Senhora do Socorro e Aracaju. Algumas vezes, o governo estadual utilizava a estrutura do Departamento de Estradas de Rodagem – DER para dar manutenção à estrada de acesso à escola. Contudo a unidade escolar agrícola sempre colaborava com instituições públicas, principalmente


a Inspetoria de Fomento Agrícola e a Defesa Sanitária Animal, vindo em seguida outras, inclusive, também, algumas prefeituras. Nossas máquinas não se limitam a cumprir apenas a finalidade de treinamento de alunos nem a trabalhar somente em nossa área. Estendemos nossas atividades a diversas zonas, mormente aos municípios mais próximos, por se tornar mais conveniente a fiscalização e o transporte do material. Até fora das fronteiras de Sergipe tem chegado a colaboração (...), que, não mede sacrifícios para elevar cada vez mais o nome da Superintendência do Ensino Agrícola e Veterinário. Assim é que, por determinação do Sr. Superintendente, cedemos por empréstimo um trator para a Escola de Satuba, em Alagoas .


Algumas vezes, o Colégio conseguia firmar parcerias com o setor empresarial agrícola e com o comércio . Outras vezes esses entendimentos consistiam em encaminhar representantes para participar de eventos promovidos pelo setor privado . Porém, na década de 40, quando a instituição ainda se denominava Aprendizado Agrícola Benjamin Constant, dentre os cursos oferecidos estava o Curso de Adaptação, aberto a toda a comunidade, que funcionava promovendo uma aproximação entre o Aprendizado e o setor agrícola, principalmente os proprietários rurais .
Na Escola Agrotécnica Benjamin Constant esse tipo de curso era oferecido principalmente através do Centro de Treinamento de Tratoristas. O Centro fora criado a partir do ano de 1952 em várias escolas da rede mantida pelo Ministério da Agricultura. O argumento utilizado pelo governo federal era o de que “Procurou-se ampliar o programa de preparação de pessoal para atender às exigências da mecanização da lavoura” . O centro oferecia o treinamento a trabalhadores rurais que, após 60 dias de aula recebiam um certificado de capacitação que os habilitava ao exercício da atividade de tratorista .
O fato é que foi comum, durante toda a história da instituição, a utilização dos equipamentos públicos para a prestação de serviços a particulares . É comum, nas memórias dos ex-diretores da escola que alguns deles acusem os seus ex-colegas de uso privado dos bens públicos da instituição. Contudo, quando se referem ao seu próprio período administrativo dizem nunca ter existido tal fato .


Os alunos deste centro logo após receberem os imprescindíveis conhecimentos teóricos e, desde que não haja serviços a executar em nossas áreas, fazem estágio de treinamento nas fazendas próximas a fim de adquirirem a necessária habilidade e o domínio completo da profissão de tratoristas. Com este método eles tomam contato direto com a realidade e experimentam toda sorte de dificuldades e imprevistos que surgem com a rotina da labuta cotidiana. Também os fazendeiros são grandemente beneficiados porque embora seus campos de cultura sirvam de treinamento, o trabalho realizado compensa satisfatoriamente. A base da cooperação é feita da seguinte maneira: o lavrador cede suas áreas de cultura, fornece alojamento e alimentação para os alunos e instrutores, assim como também todo o combustível e lubrificante necessário. O nosso Centro entra com os tratores e respectivos implementos, veículos para o transporte dos mesmos, alunos e seus instrutores. (...) atendemos a um número grande de lavradores (...) concentrando-se nossas atividades nos seguintes municípios: São Cristóvão, Divina Pastora, Estância, Aracaju, Itaporanga d’Ajuda, Ribeirópolis, Laranjeiras e Pacatuba. Nestes trabalhos estão incluídos destocamento, aradura, gradagem, semeadura, capina, transporte de material agrícola etc .


A prática não só foi corrente como valorada de modo positivo pela maioria dos professores da Escola.


Os alunos faziam estágios nas propriedades. A Escola mandava seus alunos e seus técnicos para as propriedades, E era bom. Mandava equipamentos e instrumentos agrícolas. Era bom para a Escola e era bom para os proprietários. Eles tinham um técnico que estava se especializando dentro da fazenda dele e ele ainda se beneficiava do material da Escola .

domingo, 5 de setembro de 2010

AGRÔNOMOS X DOCENTES: MEMÓRIAS DAS DISPUTAS PELO PODER NA ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SÃO CRISTÓVÃO

Este era, de um modo geral o ponto de vista de engenheiros agrônomos e médicos veterinários. Segundo o professor Emanoel Franco, a área à qual a instituição se destina é agrícola. A área educacional não seria, na sua opinião, capaz de gerenciar um colégio agrícola. O debate, na verdade, revela uma posição extremamente preconceituosa de alguns profissionais que atuavam no Colégio quanto a necessidade de incorporar padrões pedagógicos ao seu trabalho, o que não fora visto como necessidade profissional docente enquanto a instituição esteve subordinada ao controle do Ministério da Agricultura. O professor Cândido Augusto Sampaio Pereira, expressa esse entendimento, ao comentar, com excesso de ironia, o que entende ser Pedagogia:


a parte pedagógica começa a descobrir, (...) tenta descobrir chifre em cabeça de eqüino. (...) Maria foi para o mato e pegou a lenha. Esse tema vai ser inovado da seguinte forma: uma jovem chamada Maria saiu da cidade e foi para as campinas para pegar gravetos. Encontrou um toco e trouxe para queimar. Bom! São coisas assim fantasiosas... Eu lembro, por exemplo, do Compêndio que eu comprei, Eficiência e Eficácia. Parece que é de Tubino. Um trabalho dele que varou o Brasil inteiro (...) Eu li umas duas vezes. O que é que esse rapaz quer falar? Depois eu descobri (...) que eficiência é uma coisa e eficácia é outra. Mas é uma coisa tão boba, tão insignificante, tão irrelevante, que melhor seria que você não escrevesse Eficiência e Eficácia .


Os professores que fazem a defesa do ensino agrícola sob controle do Ministério da Educação e não do Ministério da Agricultura, algumas vezes exageram as suas críticas quanto a esta última instituição além de defenderam com ardor a necessidade do refinamento das práticas pedagógicas no ensino agrícola.


As escolas agrotécnicas têm que estar no MEC porque elas têm de ser escolas técnicas e não agrícolas. Elas precisam oferecer ensino básico, ensino médio e ensino superior, a depender da condição de formação dos seus professores. A Escola Agrotécnica Federal de São Cristóvão poderá ser amanhã um novo Centro Federal de Formação Tecnológica do Estado de Sergipe .


Já sob o controle do Ministério da Educação, o Colégio Agrícola Benjamin Constant viveu o processo de implantação da reforma do ensino da lei 5.692/1971, que determinou a mudança do sistema do ensino colegial agrícola para o ensino profissionalizante. A fim de tomar as providências necessárias à adaptação do ensino agrícola à nova lei, o MEC criou um grupo de trabalho do qual participaram professores de todo o país, estando o colégio do Quissamã representado pelos professores Tennyson Aragão e Abelardo Monteiro.
Não obstante as dificuldades para dispor de um orçamento de investimentos, a instituição escolar conseguiu se transformar em uma importante expressão do ensino agrícola brasileiro na década de 70. “Nós lideramos o ensino agrícola” . O Colégio buscou recursos para investimentos junto à Sudene e teve condições de adquirir ônibus para transportar professores e estudantes. “Os meus funcionários e professores andavam em cima de um caminhão velho” . Também foram adquiridos tratores para as práticas do ensino de técnicas agrícolas com recursos da mesma Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste, que financiou ainda a construção de praça e ginásio de esportes. Da mesma maneira foram reformados e ampliados os dormitórios e alojamentos do Colégio.
O prestígio da instituição cresceu em todo o Estado de Sergipe, durante as décadas de 60 e 70 do século XX. Em 1963, o então vice-diretor da Escola Agrotécnica Benjamin Constant, Tennyson Araújo Aragão, assumiu o cargo de diretor, até julho de 1964, quando então requereu licença para exercer o cargo de secretário da agricultura e produção do Estado de Sergipe . Durante a década de 70, o diretor do Colégio Agrícola Benjamin Constant ocupava uma das cadeiras do Conselho Estadual de Educação . Da mesma maneira, tinha assento no Conselho de Administração da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Sergipe – Emater-SE. Também junto ao Ministério da Educação era grande o prestígio institucional, a ponto de o diretor do Colégio haver sido designado pelo MEC para supervisionar as escolas agrícolas da região Nordeste. Esse prestígio e as posições políticas, todavia, foram conquistados a partir de iniciativas do próprio Colégio. Mesmo porque, o relacionamento com as instituições da política agrícola do Estado de Sergipe nem sempre era linear. Muitas dessas instituições se mantinham distanciadas do Colégio, mas este as provocava mostrando as contribuições que poderia oferecer. De certo modo, faltava a alguns dirigentes do setor agrícola a necessária clareza quanto a possibilidades de contribuição que potencialmente o estabelecimento de ensino possuía. Contudo, algumas autoridades estaduais demonstravam muita sensibilidade em relação ao trabalho do Colégio . De um modo geral, os que passaram pela sua direção costumam destacar as dificuldades de atuação no setor primário, em Sergipe. Mesmo assim, segundo o professor Laonte Gama da Silva, era importante levar os alunos da escola, principalmente os da terceira série, para as palestras sobre Agronomia que eram promovidas em Aracaju.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

AGRÔNOMOS X DOCENTES: MEMÓRIAS DAS DISPUTAS PELO PODER NA ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SÃO CRISTÓVÃO

Na década de 20 dos anos novecentos, havia uma consciência disseminada no país acerca da competência do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio para a gestão dos patronatos agrícolas. Assim, mesmo sendo uma instituição estadual, o Patronato Agrícola São Maurício, no Estado de Sergipe, foi dirigido por um técnico indicado por aquele ministério. Era, então, administrado pelo seu diretor e por um Conselho de Assistência Privada . O fato de o Patronato ser gerido por um Conselho de Assistência Privada objetivava envolver a sociedade civil com as responsabilidades de regeneração da infância pobre, uma vez que esse tipo de atividade era encarado pelo governo como


obra de solidariedade humana (...). A solução do problema, ao lado do socorro dos poderes públicos à infância desvalida, impõe-se, paralelamente, o socorro particular, entreajudando-se, ambos, nesse mister sacro-santo de previdência econômica e criminal (...). Dessa colaboração somente felizes resultados há a esperar-se, porquanto de uma conjugação de esforços, diligências e cuidados recíprocos, mais copiosas serão as messes e mais dilatado o alcance dos benefícios previstos .


Nomeados pelo presidente do Estado para um mandato de três anos, os membros do Conselho tinham como competências:


I – Agenciar recursos, donativos e somas que garantam o perfeito funcionamento do Patronato, no caso de lhe vir a faltar o auxilio da administração publica.
II – Representar ao Presidente do Estado contra a má direção do estabelecimento e qualquer fato ou circunstancia que possa afetar à moralidade e bom nome dos respectivos funcionários.
III – Facilitar a colocação do menor em fazendas particulares, uma vez concluído o aprendizado no Patronato.
IV – instituir obras de fundo moral e educativo com anuência da diretoria e de modo que não perturbem os trabalhos regulamentares.
V – Fundar uma caixa Econômica pelos Menores Abandonados, cujos recursos serão aplicados em adquirir para os alunos que concluirem o curso os instrumentos agrários ou oficinais mais necessários .


Não obstante buscar a colaboração da sociedade civil através de instituições como o Conselho de Assistência Privada, o governo estadual lamentava as dificuldades existentes para manter a instituição funcionando, afirmando que o setor privado e o governo federal não tinham a necessária sensibilidade para esse tipo de investimento:


Instituição de nobres fins humano-sociais, continua, sem outros recursos que os do Estado, a satisfazer os intuitos de sua criação, o que mais facilmente seria conseguido, se lhe não falecessem o concurso dos particulares e o auxílio da União. Acorressem, como era de esperar, esses subsídios, e teríamos a grande satisfação de anunciar completo o numero de internados, fixado em 200. Infelizmente, os recursos isolados do Estado assim não o permitiram. Atualmente recebem ali instrução moral, cívica, intelectual e profissional, 80 menores arrancados ao vicio e as más companhias, os quais amanhã, serão cidadãos úteis á Pátria .


Do ponto de vista acadêmico, contudo, todo o ensino da agricultura e a orientação geral dos serviços de campo ficavam a cargo do diretor do Centro Agrícola Epitácio Pessoa.
Desde o princípio, o cargo de diretor da instituição era um posto de representatividade política bastante evidente, que conferia prestígio ao seu ocupante. Com a federalização do Patronato, em 1934, e a sua transformação em Aprendizado, este poder ficou mais visível. Principalmente depois que, em 1940, uma legislação federal formalizou a criação da função gratificada de Diretor de Aprendizado Agrícola .
Quando, em 1964, a denominação do estabelecimento mudou para Colégio Agrícola Benjamin Constant, o poder na Escola ainda era completamente exercido pelos engenheiros agrônomos e o delegado estadual do Ministério da Agricultura tinha uma influência significativa no processo político de escolha do diretor . O controle da rede federal de escolas estava subordinado ao Ministério da Agricultura, que mantinha, com sede no Rio de Janeiro, a Superintendência do Ensino Agrícola e Veterinário – SEAV. A Delegacia do Ministério da Agricultura no Estado funcionava com um colegiado integrado pelo Delegado , pelo diretor de defesa animal, pelo diretor de defesa vegetal e pelo diretor do Colégio Agrícola.
Com a transferência do ensino agrícola federal do Ministério da Agricultura para o Ministério da Educação , os engenheiros agrônomos passariam a influenciar menos a instituição. A transferência gerou algumas polêmicas, mas há vozes que participaram do processo e que continuam a considerar que o MEC é um espaço mais adequado para a definição da política própria ao ensino agrícola que o Ministério da Agricultura:


A Escola foi melhor [quando] subordinada ao MEC. Quando ela passou para o MEC ela melhorou. Foi devagarzinho, mas o MEC tinha melhores cabeças. O MEC era mais preparado para administrar a Escola que o Ministério da Agricultura. O pessoal do MEC tinha melhor formação .


Contudo, outros professores que também participaram do mesmo processo divergem deste ponto de vista: “Houve discussões acaloradas, na época de Laonte Gama. Vieram algumas pessoas do Ministério da Educação aqui para dar cursos. Aquilo não era curso, aquilo era doutrinação” . O entendimento dos que preferiam o Colégio Agrícola Benjamin Constant sob o controle do Ministério da Agricultura era o de que a filosofia dominante no Ministério da Educação comprometia a qualidade do ensino oferecido pela escola. Nesse conflito se revelam as posições em disputa e as divergências existentes entre a orientação pedagógica dos agrônomos e a proposta que o MEC procurava implementar.


[Vieram} duas mocinhas [técnicas do MEC]. [Uma delas] perguntou: “o que é Educação?” Depois que todo mundo verteu seus pontos de vista, aí [ela] disse: “Tá todo mundo errado. A educação é tudo isso e mais alguma coisa”. Quer dizer, foi uma lição formidável. Eram muito inteligentes, mas por debaixo disso existia um veneno, eu considero um veneno. Elas vieram para aqui, com o objetivo de modificar qualitativamente o ensino. E eu disse na época: mas isso não é crime professora, nós estamos indo à frente. Elas não souberam me dizer quais as razões que elas estavam pedindo para você ensinar menos. O professor Tenisson [Aragão] se levantou inflamado: “Não há Ministério aqui que me faça... que me obrigue dar menos do que eu dou, eu vou dar... vou dizer um negócio a vocês eu vou dar mais”. O professor Giovane levantou muito mansamente e disse: “as funções algébricas, matemáticas, o meu conteúdo, é o conteúdo que a gente aprendia no ginásio antigo. Quer dizer se vocês querem minimizar isso...” .