quarta-feira, 24 de março de 2010

BOTÂNICA E HISTÓRIA

Dentre as várias áreas nas quais a pesquisa no Brasil se desenvolveu, além de muitas outras já referidas por este texto, chamam a atenção a Antropologia Física, a Fisiologia Experimental, a Zoologia, a Astronomia, a Matemática, a Geografia e a Geologia. Contudo,


das ciências de investigação, a única de que se pode encontrar uma tradição brasileira que se alonga, embora em curvas ascendentes e descendentes, desde o crepúsculo do período colonial até nossos dias, passando pelo Império, é a botânica, na exploração de cujos domínios se apresenta toda uma linhagem, iniciada por Alexandre Rodrigues Ferreira e por frei José Mariano da Conceição Veloso e continuada, entre outros, por Freire Alemão e, mais tarde, por Barbosa Rodrigues, talvez o maior botânico que o Brasil já produziu (AZEVEDO, Fernando de (Org.). As ciências no Brasil. 2 v. 2ª. ed. Rio de Janeiro, Editora UFRJ, 1994. p. 34).


Segundo Mário Guimarães Ferri, a botânica no Brasil começou com o índio.


Indo à caça, o índio levava arco e flecha. Flecha às vezes envenenada com veneno tirado de certas plantas. O arco compunha-se de arco propriamente dito e da corda que ligava seus extremos. Não era qualquer madeira que servia para a confecção do mesmo. Nem todas as tribos empregavam para isso os mesmos materiais (FERRI, Mário Guimarães. “A Botânica no Brasil”. In: AZEVEDO, Fernando de (Org.). As ciências no Brasil. 2 v. 2ª. ed. Rio de Janeiro, Editora UFRJ, 1994. v. 2. p. 175).


Os índios fabricavam as suas habitações com vegetais, teciam redes com fibras, fabricavam bebidas fazendo fermentar a mandioca, pintavam o corpo com tintas de jenipapo, cultivavam algodão, fumo, mandioca, batata doce, milho, feijão e amendoim, conheciam plantas medicinais. Enfim, dominavam algo que poderia ser chamado de cultura botânica. Os padres Manoel da Nóbrega e José de Anchieta registraram na sua correspondência o uso que os índios faziam das folhas de fumo e Hans Staden comentou a exploração do pau-brasil.
A opção de muitos intelectuais brasileiros dos séculos XVIII e XIX foi por um campo científico de muito prestígio para os naturalistas desde o século XVII, em todo o mundo: o da Botânica. Assim, são muitos os registros existentes no Brasil e em outras partes do planeta a respeito do sucesso que tinham os botânicos como cientistas. Natalie Zemon Davis relata a trajetória de Maria Sibylla Merian, uma naturalista do século XVII, que abraçou a Botânica, a Entomologia e a Pintura como profissão (DAVIS, Natalie Zemon. Nas margens: três mulheres do século XVII. Tradução Hildegard Feist. São Paulo, Companhia das Letras, 1997). Numa época em que das mulheres se cobrava recato, Sibylla embarcou em Amsterdam, no mês de junho de 1699, com sua filha Dorothea, em direção ao Suriname, onde pretendia estudar e pintar insetos, borboletas e plantas.
Foi sob a influência do frei José Mariano da Conceição Veloso que Sergipe conheceu os seus primeiros experimentos científicos, exatamente no campo da Botânica. Quando a Capitania se tornou independente da Bahia em oito de julho de 1820, por Carta Régia de D. João VI, o botânico Antônio Moniz de Souza já havia viajado pelo seu território, desenvolvendo pesquisas, explorando e catalogando a flora da região situada entre os rios Real e São Francisco. Este campo foi aquele que inaugurou a pesquisa científica por aqui. O pesquisador era um sergipano que havia morado no convento de Santo Antônio, no Rio de Janeiro, durante três anos, onde aprendeu Botânica com o famoso naturalista brasileiro, José Mariano da Conceição Veloso, que vivia no mesmo claustro e que, além de ministrar os ensinamentos ao explorador sergipano, franqueou a sua biblioteca pessoal para que este pudesse desenvolver os seus estudos (GUARANÁ, 1925, 29). Além de estudar com os livros do frei Mariano Veloso, Moniz de Souza teve a oportunidade de aprofundar os seus conhecimentos acerca das propriedades curativas dos vegetais trabalhando na botica da enfermaria do mesmo convento, onde se encarregava de tirar extratos e fazer cozimentos.
Fazer viagens e expedições era responsabilidade dos botânicos e de outros naturalistas até o início do século XX. Deles se cobrava o espírito aventureiro. A vida dos cientistas era marcada por muitas reviravoltas. Ao discutir a vida da alemã Maria Sibylla, Natalie Davis demonstrou que esta ganhou fama como cientista na Holanda, depois que voltou da América carregada de espécimes. Publicou “sua grande obra Metamorphosis insectorum surinamensium (Metamorfose dos insetos surinameses), ampliou seu trabalho sobre Insetos europeus e até sua morte, em 1717, ocupou lugar de destaque entre os botânicos, cientistas e colecionadores de Amsterdam” (DAVIS, Natalie Zemon. Nas margens: três mulheres do século XVII. Tradução Hildegard Feist. São Paulo, Companhia das Letras, 1997. p. 133).
Em 1812, um ano depois da morte do frei José Mariano da Conceição Veloso, Antonio Moniz de Souza resolveu abandonar o convento e embarcou para a Bahia, onde obteve licença do governador da Bahia, o Conde dos Arcos, para realizar uma expedição pelos sertões daquela Capitania, também por ele financiada. A área escolhida como objeto de estudo por parte da expedição que Antonio Moniz comandou corresponde ao território delimitado por D. João VI para a Capitania de Sergipe D’El Rey, nos limites do território baiano com Pernambuco e Alagoas (GUARANÁ, Manoel Armindo Cordeiro. Dicionário bio-bibliográfico sergipano. Aracaju, Estado de Sergipe, 1925. p. 29).

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