segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

OS ESTUDOS SOBRE INTELECTUAIS NA HISTORIOGRAFIA DE MARIA THETIS NUNES

A discussão a respeito dos intelectuais na historiografia de Maria Thetis Nunes feita por este trabalho está dividida em dois momentos. No primeiro são apresentados os dados da copiosa contribuição desta autora a esse campo de estudos específicos, colocando em relevo dados estatísticos a respeito da sua produção. Num segundo momento são analisados os traços dominantes da produção dessa historiadora sobre os intelectuais. São examinados, principalmente os temas e as abordagens pelos quais a autora opta.
São muito importantes os estudos em torno dos intelectuais. Recompor suas trajetórias, seus lugares suas intervenções na cena cultural e política pode ensejar uma compreensão mais acurada dos processos mediante os quais foram cotejados e postos em disputa padrões de formação da vida social. A obra da professora Maria Thetis Nunes tem se debruçado sobre um grande número de intelectuais que, de diferentes origens acadêmica e profissional, deram suporte à vida cultural brasileira. Os intelectuais estudados por esta autora marcam a vida de Sergipe e do Brasil.
Cabe, então, esclarecer o sentido deste trabalho. O que aqui foi chamado de “Os estudos sobre intelectuais na historiografia de Maria Thetis Nunes” é um estudo introdutório acerca do modo como os intelectuais aparecem na obra da autora examinada . É evidente que toda a sua produção bibliográfica está pontuada pela presença de intelectuais e do diálogo que a autora mantém com estes. Contudo, o que interessa aqui não são as aparições referenciais, mas os estudos produzidos especificamente para analisar obras e trajetórias de vida dos intelectuais. Os limites deste texto estão, portanto, circunscritos aos cinqüenta e quatro trabalhos sobre intelectuais produzidos pela autora. O dado por si já demonstra o destaque que tem na obra de Maria Thetis Nunes o estudo da intelectualidade, uma vez que, estatisticamente, sem valorar a produção e computando-se apenas título por título, esse tipo de trabalho representa metade da produção da autora.
A importância de Maria Thetis Nunes pode ser medida pela sua produção como pesquisadora. A partir da sua posição no Departamento de História da Universidade Federal de Sergipe, ela publicou inúmeros livros e artigos sobre uma ampla diversidade de temas do campo, tornando-se referência obrigatória aos estudos sergipanos da área. No final da década de 1950 e início da década de 1960, ela foi uma aplicada estagiária do Instituto Superior de Estudos Brasileiros – ISEB, no qual ligou-se a intelectuais como Nelson Werneck Sodré e Álvaro Vieira Pinto, onde aprendeu a pesquisar sob o viés da teoria marxista tal como concebida pela esquerda isebiana. A obra de Maria Thetis Nunes é marcada por uma recorrente perspectiva teórica e pelo mesmo padrão metodológico que assumiu na década de 1950. O seu viés interpretativo assumiu ser a história fundamentalmente a história das lutas de classes. A partir daí a autora fez uma série de operações analíticas, nas quais as evidências que extrai das fontes se prestam a localizar as relações entre burguesia e proletariado. Do mesmo modo, para identificar os interesses que as classes dominantes defendem.
Pelo pioneirismo dos seus estudos e pelo esmero com o rigor metodológico das perspectivas teóricas que assumiu, Maria Thetis Nunes inspirou teórica e metodologicamente as gerações de pesquisadores que têm trabalhado tomando os seus estudos como fonte. Como ela, seus herdeiros assumiram a teoria marxista. Por contraditório que possa parecer, o conjunto de estudos realizado por Maria Thetis Nunes sobre intelectuais leva à reflexão a respeito do papel que o indivíduo exerce na história. Thetis, certamente, valoriza a importância do sujeito/indivíduo. Como lembra Vavy Pacheco Borges,

os problemas de interpretação de uma vida são riquíssimos, pois nos defrontam com tudo que constitui nossa própria vida e as dos que nos cercam. Num círculo vicioso, exigem de nós auto-conhecimento e preocupação com a compreensão dos outros seres humanos; mas, ao mesmo tempo, podem acabar por reforçar em nós tudo isso .

Ao estudar a trajetória dos intelectuais, é necessário compreender as pressões sociais que atuam sobre o indivíduo. Este é um esforço presente nos estudos de Thetis Nunes. Não basta apenas produzir uma narrativa histórica, mas, como faz a autora, de certa maneira, elaborar um modelo teórico. Ela busca apreender na estrutura os modos através dos quais a sociedade atua no indivíduo, uma vez que, como entende, mesmo sendo autônomo o intelectual está subordinado a tal estrutura, posto ser “simplesmente impossível para uma pessoa ter uma propensão natural geneticamente enraizada de fazer algo” .
É, portanto, objetivo do estudo, conhecer os principais intelectuais sobre os quais Maria Thetis Nunes se debruçou, conhecer o esforço de compreensão da intelectualidade, empreendido pela autora. É, portanto, uma leitura compreensiva que decorre da necessidade de examinar sob diferentes ângulos a obra de um dos mais produtivos dentre os intelectuais que têm atuado contemporaneamente no cenário dos estudos de história produzidos a partir da Universidade Federal de Sergipe. É inegável que esse campo de estudo, que se detém sobre os intelectuais, tem visto crescer a sua importância nas últimas décadas e tem sido objeto da preocupação permanente dos historiadores. No caso dos estudos produzidos em Sergipe, não é difícil obter tal comprovação. Basta que nos debrucemos sobre um trabalho que produzi em 2003 para verificar que somente os pesquisadores do campo da História da Educação em Sergipe, no qual Maria Thetis Nunes tem atuação destacada, produziram na última década dezoito trabalhos sobre intelectuais, entre monografias, dissertações de mestrado e artigos científicos .
O conjunto de estudos realizados por Maria Thetis Nunes é constituído principalmente por artigos publicados em revistas científicas e jornais. Sem dúvida, jornais e revistas são as principais publicações periódicas, veículos importantes para a difusão e legitimação do discurso dos intelectuais. “O jornal como veículo rápido de notícias, a revista menos sujeita às contingências da rapidez e mais adequada para refletir diferentes aspectos da vida cultural e atender a interesses específicos” . Mas, há também trabalhos em anais de eventos científicos dos quais ela participou, e onde divulgou parte dessa produção, além das separatas que produziu. A maior parte dessas histórias de vida apresentadas por Maria Thetis se pautou em dados que invariavelmente incluem data e local de nascimento, filiação, prole, formação educacional, profissão, exercício de funções públicas e morte.
Em Thetis Nunes, os estudos sobre intelectuais têm cumprido diversos papéis. Dentre eles o de celebração de uma memória que cria vínculos de identidade entre os pesquisadores do tempo presente e autores e obras que atuaram sobre o tempo passado. A partir da discussão que Thetis Nunes faz com e sobre os seus intelectuais, emergem problemas que concernem à historiografia, à teoria da história que orienta a sua produção. Nos seus intelectuais, a autora busca os sentidos da experiência histórica e da vivência dos homens que analisa . Ao verificar essa experiência, ela trabalha o sentido da construção de um passado glorioso para Sergipe e os seus intelectuais, tentando demonstrar os momentos nos quais intelectuais sergipanos se puseram à frente dos seus pares de outras regiões do Brasil. É explícita em relação a esse tipo de problema ao falar de Tobias Barreto e da defesa que fez este autor em relação aos direitos da mulher . Ou, quando apresenta o trabalho do historiador e político Felisbelo Freire , afirmando que o regimento da instrução pública aprovado por este governante do Estado de Sergipe, no período republicano, antecipou a reforma Benjamim Constant, implementada posteriormente a partir do Rio de Janeiro, a capital da nascente República. Esta é uma discussão ao gosto da historiadora Maria Thetis Nunes. A polêmica a respeito do pertencimento das idéias e a busca incansável das novidades que podem nascer na periferia.

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