quinta-feira, 5 de agosto de 2010

CONTRIBUIÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA EM SERGIPE - II

O estudo dos fenômenos espíritas pela Psicologia preocupou importantes estudiosos não apenas no Brasil mas em todo o mundo, durante as primeiras décadas do século XX. Em São Paulo, na cidade de Santos, durante o mesmo período foi fundada a Academia de Estudos Psíquicos Cezare Lombroso, onde o mesmo Mirabelli foi investigado. O próprio Lombroso declarou, na Itália, que não era espírita, mas admitia a possibilidade de estudar os fenômenos espíritas cientificamente: “Acho-me completamente confuso e lastimo de ter combatido com tanta teimosia a possibilidade dos fatos chamados espíritas; digo dos fatos porque me conservo ainda oposto à teoria. Mas os fatos existem e eu me gabo de ser escravo dos fatos” (Aurora Espírita, 1907: 226). Em Sergipe, alguns membros da Sociedade de Estudos Psíquicos defendiam idêntica posição. Florentino Menezes, de convicções teóricas materialistas, via o interesse pelo Espiritismo como um caminho melhor que o do Catolicismo para os que queriam dedicar-se à ciência, “já que, ele não feria a lógica e as manifestações superiores da inteligência e da cultura” (WENDLING, 2004: 15). Sob as teorias científicas influenciadas pelo Positivismo, o estudo da psique foi laicizado. Freud tentou levar as pessoas a entenderem sua incompletude, seu desamparo e via a religião como mais uma tentativa do homem para escolher um senhor que guiasse os seus passos (Freud, 1969).


Já os behavioristas, limitaram-se ao estudo do comportamento humano, objeto que pode ser observado, em uma tentativa de excluir os chamados mentalismos. Talvez pela ligação dos chamados fenômenos mediúnicos ao Espiritismo e a esfera do sobrenatural, eles não constam como objeto de nenhuma das teorias ‘oficiais’ da Psicologia do início do século XX. Somente em meados dessa centúria a chamada quarta força da Psicologia (que inclui a Psicologia Transpessoal e Existencial) deu espaço a dimensão espiritual do homem como objeto de estudo e de aplicação de seus pressupostos (WENDLING, 2004: 17).


Membro da Comissão de Pesquisas Psicológicas da Sociedade de Estudos Psíquicos, em seu Tratado de Sociologia Florentino Menezes discute as teorias da Psicologia. Ele discorreu acerca da Psicologia sob distintas perspectivas, dando ênfase ao evolucionismo e à ciência positiva. Em um parágrafo discutiu a “Psicologia espiritualista”, oposta a sua visão materialista da psique e caracterizada por pressupostos dualistas. Esse dualismo “estabeleceu um consenso que permitiu, por exemplo, a convivência de um materialista crítico do cristianismo, como Florentino Menezes, com uma das fundadoras da União Espírita Sergipana, Laura Amazonas”, em uma mesma sociedade científica (WENDLING, 2004: 24).
No mesmo ano de 1928, no qual foi criada a Sociedade de Estudos Psíquicos, o Sergipe Jornal começou a publicar, em fascículos, o livro da italiana Emma Gagnis di Castellomonte, O sentimento estético na Psicologia e na Educação. Traduzido por Manoel dos Passos de Oliveira Teles, sob o pseudônimo de Garcia Moniz, especialmente para o periódico, a publicação foi dedicada ao comerciante italiano Nicola Mandarino. A edição do dia 15 de junho publicou o texto introdutório “O sentimento do belo na vida e na educação contemporânea”. A discussão abrangia questões como “A contemplação do bello”; “Que lugar ela ocupa na vida contemporânea: preponderância do sentimento materialista e utilitário sobre o sentimento estético”; “Primeiros indícios de renovação direta para dar mais grande parte ao ideal estético na vida”; “Relação entre a vida e a educação: como entre os vários povos e nos principais períodos históricos os sistemas de educação correspondem a uma concepção da vida especial”; “O positivismo moderno: a finalidade prática dos seus princípios de educação: conseqüência a que conduz”; “Deficiência da nossa cultura: nova reação contra o intelectualismo e o utilitarismo: necessidade de uma reforma direta para dar maior desenvolvimento e maior importância ao sentimento estético no campo da educação” (SERGIPE JORNAL, 15/06/1928: 6). Esta introdução teve o seu texto integralmente publicado em três edições, a última no dia 18 de junho (SERGIPE JORNAL, 18/06/1928: 2).
Os textos traduzidos ocuparam as edições do Sergipe Jornal durante os meses de junho, julho, agosto, setembro e outubro. Em dois de outubro foi iniciada a publicação do capítulo que discutia “A missão do educador: como para cumprir a sua finalidade não basta a consciência do dever, mas também é preciso o sentimento do belo”; “A beleza no menino: como o educando deve senti-la em suas varias manifestações”; “Como ao educador é necessário o sentimento do belo afim de que possa entender e dirigir as tendências estéticas de seus alunos”; “Para que o seu sentimento com veemência possa corresponder ao deles”; “Para poder suscita-lo quando ausente”; “Para poder subir à visão ideal da sua obra” (SERGIPE JORNAL, 02/10/1928: 2). Nas quatro edições seguintes, o texto continuou a ser publicado. Porém, depois da edição de 10 de outubro, as publicações foram interrompidas, sem que o Sergipe Jornal oferecesse qualquer explicação (SERGIPE JORNAL, 10/10/1928: 2). Foram publicadas cerca de 100 páginas do livro de Emma Gagnis di Castellomonte. O material traduzido, não obstante haver sido interrompido, permite, através de comentários inseridos pelo tradutor, que se tenha um panorama das idéias sobre a Psicologia que circulavam em Sergipe no início do século XX, informando a respeito dos autores mais lidos naquele período.
Dentre os autores mais citados aparece com muita freqüência o nome de Herbert Spencer, associado ao livro Princípios de Psicologia. Contudo, ao que parece, poucos autores e poucas teorias entusiasmavam tanto os interessados nos estudos de Psicologia quanto o Pragmatismo do norte-americano William James, no seu livro Princípios de Psicologia.
Garcia Moniz relata que a edição por ele traduzida continha na primeira página uma dedicatória ao professor Paolo Raffaello Trojano: “All illustre maestro Prof. Paolo Raffaello Trojano queste pagine in cui si reflette tanta luce Del suo pensiero con reverente auimo I’autrice”. O tradutor produziu um comentário sobre a própria Emma Gagnis di Castellomonte. Diz que somente a leitura de O sentimento estético na Psicologia e na Educação seria suficiente para convence-lo quanto às boas qualidades da autora. Contudo afirma conhecer outras obras suas, como Per Pidea e Stelle Nere. Ressalta que no trabalho traduzido, ela demonstra “pujança de talento, sólida ilustração e empolgante estilo”. Quanto ao estilo, incorpora comentários de Tobias Barreto, para dizer que “a frase nas margens do Senna e do Mauzanares é discussão e argumento, porém nas margens do Arno e do Tibre è um encanto, uma delicia” (SERGIPE JORNAL, 15/06/1928: 6).
Em O sentimento estético na Psicologia e na Educação, Castellomonte vê a Psicologia como uma ciência que, além de guia para um aprimoramento, ajudaria na compreensão do sentimento do belo, o qual levaria o aluno a aprender melhor.

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