quarta-feira, 21 de outubro de 2009

ANOTAÇÕES SOBRE A BOTÂNICA EM SERGIPE DURANTE A PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XIX - II

OS INTELECTUAIS DO SÉCULO XIX


Eugênia Andrade Vieira da Silva estudou a formação da elite intelectual em Sergipe no período de 1822 a 1889 (SILVA, 2004). A partir do seu trabalho é possível afirmar que inicialmente a elite intelectual sergipana era formada no exterior. Contudo, até a metade do século, a maior parte dos portadores de diploma de graduação já era oriunda das faculdades de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro e dos cursos jurídicos de Olinda e São Paulo, além das escolas militares e dos seminários. O crescimento da produção açucareira em Sergipe e as outras necessidades de organização da Província estimularam a demanda por escolas superiores do Brasil e da Europa, durante toda a primeira metade do século XIX, fenômeno que persistiu também durante a segunda parte da mesma centúria. Esses estudantes eram, predominantemente, filhos da elite econômica e buscavam a legitimação como intelectuais possuidores de diplomas através da publicação de trabalhos de caráter científico.
Assim, é possível afirmar que durante o século XIX foi constituído um campo intelectual em Sergipe, do qual participou um número significativo de cientistas, não obstante boa parte dos estudos sobre esse tema atribuir a formação de tal campo ao período republicano. Estudar a intelectualidade dos anos oitocentos permite entender a falácia de alguns estudos para os quais a elite daquele período seria iletrada e detentora apenas do “poder econômico e político, sem nenhuma vinculação com o campo intelectual, o que de imediato parece algo paradoxal, pois, a suposição é a de que ninguém chega a ocupar posição de mando na sociedade sem que se utilize a capacidade mental” (SILVA, 2004, 5). O campo que se constituiu deu visibilidade aos intelectuais e permitiu a existência de uma rede de instituições escolares públicas e privadas, bem como outras organizações científicas e tecnológicas que amparavam os estudiosos. Quando se estuda o funcionamento dessas instituições no Brasil dos anos oitocentos, fica bem claro que


a institucionalização da Ciência que se acentuou no final do século XIX vinha se forjando havia tempo. Certamente, se não existissem escolas de ensino secundário e superior, museus, agremiações científicas e outras instituições por onde circulassem os conhecimentos, não haveria na sociedade o lastro científico-cultural que propiciou a ampliação significativa do quadro das instituições de cunho científico na virada do século (ALMEIDA, 2003, 31).


É importante assinalar que essa intelligentsia era composta não apenas por intelectuais portadores de diplomas emitidos pelas faculdades, mas também por estudiosos que não possuíam formação superior (SILVA, 2004, 2). No estudo de Eugênia Andrade Vieira da Silva foram selecionados 400 nomes reconhecidos à época como intelectuais. Destes, 260 eram portadores de diplomas emitidos por instituições de ensino superior, enquanto 140 não tiveram acesso a esse tipo de formação. Dentre os que obtiveram formação superior, 254 o fizeram no Brasil e apenas seis em instituições estrangeiras. Os médicos, farmacêuticos, engenheiros agrônomos, engenheiros civis e militares eram a maioria dentre os intelectuais que possuíam formação obtida em curso superior. Os que não possuíam diplomas emitidos por faculdades eram legitimados por seus pares diplomados e não diplomados que exercem o controle do campo no qual atuavam.
Era esta a elite intelectual do século XIX. Um grupo que, pelas suas características se sobrepunha a outros grupos, uma vez que o conceito de elite “designa um pequeno grupo que, num conjunto mais vasto – religioso, cultural, político, militar, econômico, social ou outro – é tido como superior pelas suas funções de mando, de direção, de orientação ou de simples representação” (BARATA e BUENO, 1999). A elite intelectual sergipana é, assim, concebida “como sendo composta por vários grupos constituidores, oriundos de diferentes elites profissionais, que contribuíram para a formação de uma totalidade” (SILVA, 2004, 6). Nessa elite intelectual, boa parte dos seus membros exerceu atividades ligadas ao campo da chamadas humanidades, principalmente os que receberam formação nas escolas de Direito e nos seminários. As atividades ligadas ao campo das chamadas ciências da natureza foram próprias, principalmente, dos que receberam formação em Medicina e Engenharia, além dos militares. Os engenheiros, contudo, adquiriram maior visibilidade social durante a segunda metade do século XIX, após a criação da Escola Politécnica, em 1874 (COELHO, 1999, 94). Autores como José Gonçalves Gondra afirmam que a ação dos médicos foi muito importante no projeto civilizatório da sociedade brasileira (GONDRA, 2000, 25). Os médicos, os farmacêuticos e os cirurgiões dentistas deram significativas contribuições para o desenvolvimento de campos científicos como a Química, a Biologia e a Botânica. Os engenheiros e os militares contribuíram com a pesquisa que viabilizou a execução de “obras básicas da modernidade do país, como as dos serviços públicos urbanos” (SILVA, 2004, 16), além de estimularem a pesquisa em campos como os da Física, da Matemática, da Geografia e da Astronomia.

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