terça-feira, 8 de dezembro de 2009

CRIANDO O CAMPO CIENTÍFICO

No Brasil do Primeiro Império foram criadas as faculdades de ciências jurídicas de Olinda e São Paulo e as de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro, a partir da transformação dos cursos criados por D. João VI. A Regência reformou os cursos de Engenharia Civil, Militar e Naval. Já sob o Segundo Império, em 1858, a Escola Militar foi transformada em Escola Central, criando-se as seções de Ciências Naturais e Matemáticas e de Ciências Físicas e Matemáticas. Sob o ministério do Visconde do Rio Branco, a instituição foi reformada e transformada em Escola Politécnica, com os cursos de Ciências Matemáticas, Físicas e Naturais. O Visconde fundou também, em 1875, a Escola de Minas, para formar engenheiros especialistas em Mineralogia, Geologia e Minas.
A difusão no Brasil de todo o debate sobre ciência e cultura que se irradiava por toda a Europa a partir, principalmente da Alemanha, recebeu forte estímulo de uma conjunção de fatores, dentre os quais é possível destacar o crescimento do protestantismo, não apenas tolerado, mas, também, intensivamente estimulado pelo Estado monárquico. Desde os primeiros anos após a independência é possível encontrar evidências indicadoras desse estímulo, no bojo da política de substituição da mão-de-obra escrava empreendida pela monarquia brasileira, a exemplo da remuneração dos pastores protestantes patrocinada pelo Governo do Brasil a partir de 1825, apesar de ser o Estado oficialmente católico. Ou, da Fala do Trono de maio de 1858, quando o Imperador Pedro II defendeu junto ao Parlamento a concessão da liberdade de culto às religiões protestantes. Tradição protestante que o Brasil já conhecera bem antes mesmo do período da ocupação holandesa em Pernambuco.
No primeiro século da colonização, em 1555, quando Nicolas Villegagnon fundou a França Antártica na Baía de Guanabara, o almirante Coligny montou a estratégia de estabelecer colônias protestantes no Brasil. Em 1557 chegou o primeiro contingente de refugiados huguenotes que o almirante havia solicitado a Jean Calvin. O Visitador-Geral Heitor Furtado de Mendonça, quando da primeira visitação do Santo Ofício a Pernambuco já denuncia em seu relato uma forte presença de comerciantes protestantes alemães. Gilberto Freyre relata problemas vividos pela Província de Pernambuco, em 1858, a fim de sepultar alemães protestantes, quando estes faleciam em Recife. Problema que era resolvido sempre pelo Cônsul de Sua Majestade Britânica, que autorizava o sepultamento no Cemitério dos Ingleses.
De um modo geral, o mercado editorial brasileiro do século XIX dá bem a medida dessa influência. A primeira editora brasileira, a Livraria Universal, fundada em 1833, tinha como sua principal atividade a tradução de originais alemães. Outro bom indicador é o processo de estabelecimento das colônias de alemães que se expandiu desde as primeiras décadas do século XIX, a partir da Bahia. A primeira dessas colônias a funcionar no país foi a Leopoldina, instalada em 1823, na vila Viçosa, região de Porto Seguro. Segundo Antônio Moniz de Souza seus fundadores eram naturalistas.
A colônia Leopoldina chamava a atenção pelo seu arranjo, limpeza, economia, padrões que à época eram considerados coerentes com o melhor método de produção agrícola. As casas eram bem construídas e mobiliadas. A mobília era produzida pelos próprios colonos e as hortas abundantes, além dos grandes pomares. O emprego de máquinas agrícolas era intensivo e dentre as culturas exploradas, o café era a principal. Os colonos alemães possuíam embarcações que utilizavam para exportar os gêneros produzidos em direção aos portos da Bahia e do Rio de Janeiro.
Em 1916 foi criada no Brasil a instituição que receberia, em 1922, a denominação de Academia Brasileira de Ciências – ABC. A criação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, em 1948, representou um passo importante na luta pela afirmação e pela participação política dos cientistas no Brasil. No Brasil, a educação e a ciência são financiadas desde o princípio com recursos do Estado. Portanto, na prática, o reconhecimento científico significa ser aceito pelo Estado, pelos governos, como interlocutor que porta algum grau de legitimidade. Para compreender a atuação política da ABC e da SBPC é importante verificar o significado que teve para a ciência brasileira o golpe militar de 1964. Em relação ao período da ditadura militar iniciada em 1964, certamente ainda não vivemos o suficiente. Por isto, temos sido capazes, apenas, de apontar suas mazelas, sem produzir análises isentas sobre sua política científica.

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