sábado, 12 de fevereiro de 2011

ALEMANHA, FRANÇA, ESTADOS UNIDOS. A PEDAGOGIA DE SÍLVIO ROMERO DIANTE DO ESPELHO - IV

A discussão de Sílvio Romero a respeito do ensino público no Brasil o levava a debater a maneira como a influência de outras culturas se fazia presente entre nós. A mais fundamental de todas as influências era, sem dúvida, a prussiana. Ele localizava no governo de Frederico o momento em que a instrução pública passaria a ter um papel primordial para os germânicos. Dizia que a qualidade da educação daquela sociedade foi fundamental para que se fizesse o seu reerguimento depois do esmagamento imposto pelos exércitos franceses em 1806. A instrução pública é que teria sido o grande instrumento para que os alemães acumulassem as vitórias necessárias até chegarem a derrota total da França em Sedan. Também a educação Sílvio Romero atribuía o desenvolvimento dos norte-americanos, suíços, dinamarqueses e ingleses. Assinalava que todos estes eram povos protestantes e atribuía ao protestantismo parte desse êxito, tal como continuariam a faze-lo mais de meio século depois as interpretações de Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo em face do pragmatismo norte-americano . Mas ressaltava que alguns Estados nacionais católicos também haviam conseguido importantes êxitos em face do seu sistema de ensino e exemplificava com o sistema de ensino da França, não obstante a sua manifesta má vontade para com a cultura francesa. Assinalava que os Estados nacionais europeus, além de manterem a gratuidade do ensino para todos, ainda distribuíam livros, roupa e material escolar em geral nas regiões mais pobres.
A força que o ensino público ganhara no século XIX era vista como resultante de um processo que destruíra a aristocracia e democratizara o poder econômico e político, da mesma maneira que distribuiu melhor os saberes e talentos. Não havia mais uma classe social determinada a produzir grandes idéias, grandes doutrinas, grandes obras de arte – interpretava Sílvio Romero. “É o advento do quarto Estado, o domínio da democracia pura, o reinado do proletariado em todo o mundo ocidental, desde os Montes Urais até as Campinas da Austrália, passando pelos píncaros dos Andes” .
O acesso do proletariado ao poder, tal como o via Sílvio Romero, era um caminho competente de luta pela vida no que ela tem de mais doloroso – a miséria. De todo esse processo, o nosso autor abominava o industrialismo americanizado e afirmava que essa tendência já fizera grandes estragos na Europa, principalmente na França, porque levada às últimas circunstâncias. Esse industrialismo teria levado a França ao dualismo escolar, que Sílvio Romero rejeitava. Criticava o fato de terem sido criadas na Europa escolas primárias que se destinavam aos candidatos a carreiras industriais e outras que iriam servir aos que desejavam a carreira literária. Fenômeno que também foi verificado no ensino secundário.
O Brasil não poderia permitir, sob a perspectiva de Sílvio Romero, que trilhássemos o mesmo caminho que levou a França a implantar a dualidade escolar. A única maneira de evita-lo seria fazer com que o governo central entendesse as suas responsabilidades frente ao ensino primário e se ocupasse dele em todo o território nacional. O ensino primário seria assim a compensação que daria a todos os cidadãos um Estado brasileiro que os impedia de exercer a cidadania através do voto – e aí, ele criticava já o Estado republicano. O ensino primário seria, no seu entendimento, uma espécie de marca da modernidade que toda sociedade deveria ter como ponto de partida da sua organização econômica, já que Romero considerava terríveis as exigências que o capital impunha ao trabalho. Explicava que nas sociedades democráticas o governo não está fundado na vontade de Deus, mas sim na decisão coletiva do povo e que, por isto, a instrução pública adquiria o status de pré-requisito do exercício do governo. O fato elementar de o ensino primário não envolver questões que dizem respeito a doutrinas transcendentais, não ser fundamentalmente um espaço no qual as crenças se põem chocadas, faz dele uma função pública geral que deve ser imposta, obrigatoriamente, a todos. Deve ser igual para todos, pois não tem caráter técnico e muito menos especializador a ponto de requerer diferenciações.
O fato de a União assumir o ensino primário em todo o país apresentava inúmeras vantagens, sob o raciocínio de Sílvio Romero. Uma delas dizia respeito ao fato de ser este um meio que tornaria possível retirá-los dos interesses menores que normalmente são mesquinharias da aldeia, dando-lhes um tom nacional que se põe acima de todos os outros. A escola primária seria um instrumento de consolidação do Estado nacional brasileiro, destinar-se-ia a ser o cimento a formar e unir o caráter do povo, constituindo-se em privilégio na União. Estava claro que a sociedade moderna não poderia prescindir do ensino obrigatório.

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