sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

A REMUNERAÇÃO, OS CONCURSOS E ALGUNS PROFESSORES E PROFESSORAS: ASPECTOS DA PROFISSÃO DOCENTE NA HISTÓRIA DE ARACAJU - II

A CARREIRA DOCENTE


A existência de uma carreira para os profissionais da docência que atuavam na cidade de Aracaju somente ganhou visibilidade após a criação do Atheneu, no final do ano de 1870. A criação da instituição de ensino secundário e o estabelecimento da sua congregação docente impressionou, dentre outras coisas, pelo fato de que os professores catedráticos da instituição passaram a receber um remuneração que os destacava do conjunto de funcionários públicos.
Contudo, não obstante a existência de algumas representações dando conta de um idílico passado no qual os professores eram remunerados com dignidade, é importante lembrar haver sido bem distinta a realidade, não apenas na cidade de Aracaju, desde que esta foi fundada em 1855. Pagar baixos salários ao magistério foi prática corrente não somente na cidade de Aracaju. A Província e o Estado de Sergipe, o Brasil e a maior parte das nações sempre remuneraram muito mal os seus docentes. “Ao contrário do que se pensa comumente, essa profissão desde a sua origem (e não só no Brasil) era mal remunerada e desprestigiada socialmente” (VILLELA, 1992, 34).
Pesquisadores como Itamar Freitas operam com a hipótese explicativa de ser o magistério um grupo de profissionais do setor público que se tornou bastante numeroso, impactando de modo significativo os custos da folha de pagamento dos salários do poder público (FREITAS, 2003c).


Esse crescimento, provavelmente, interferiu no processo de construção da identidade profissional do professor. A assertiva tanto vale para o papel exercido pelo expressivo contingente de professores no estabelecimento de normas, rotinas e, quem sabe, direitos, como para o regramento dos seus diretos e deveres pelo Estado, levando-se em conta o significativo peso que representava a categoria na despesa geral da província (FREITAS, 2003c, 3).


Em Aracaju, situações como as dos catedráticos do Atheneu e da Escola Normal foram excepcionais. A situação financeira do magistério era dramática desde a fundação da cidade em 1855. Para que se faça uma avaliação, os profissionais do ensino primário permaneceram durante vinte anos sem aumento salarial, entre 1896 e 1916 (NUNES, 1984, 228). O pesquisador e professor da Escola Normal, José Antônio Nunes Mendonça, descreveu, em 1955, a situação dos professores, utilizando as mesmas expressões das quais o médico Helvécio de Andrade lançara mão em 1931:


O quadro pintado pelo Dr. Helvécio de Andrade (“Escola Sergipana”), em 1931, persistia ainda, na viveza de suas cores, no presente. Naquele ano, assim se externava o ilustre educador sergipano: - “O professorado primário e normal tem vergonha, é o termo, de dizer quanto ganha, aquele menos que um porteiro (...). O professor é esquecido; não tem necessidades sociais e morais, não precisa estudar, ter livros, elevar-se, nobilitar-se; mesmo sob o peso de todas as dependências humilhantes deve ensinar bem e melhor” (MENDONÇA, 1958, 165).

Os professores do Atheneu, da Escola Normal e da Escola de Comércio sempre foram admitidos através de concurso público ou diretamente nomeados pelo diretor geral da Instrução Pública. A maioria deles lecionava em outros estabelecimentos e muitos ministravam aulas particulares (FREITAS, 2003a, 108).
Com a implantação do Atheneu foi criado também um grupo de elite entre os docentes da Província de Sergipe. A partir de 1877 a remuneração dos professores do estabelecimento de ensino foi estabelecida em um conto e quinhentos mil réis (FRANCO, 1880, 659). É inegável a influência exercida pelo bacharel e professor Manoel Luiz de Azevedo e Araújo (FRANCO, 1880, 116) no processo de organização do Atheneu e na obtenção do padrão remuneratório dos catedráticos. Estes, porém, constituíam um reduzidíssimo e poderoso grupo, insignificante estatisticamente quando confrontado com o número total de professores existentes, que tinha prestígio não apenas pela condição de professor, mas pelo exercício de outras funções que acumulavam com a docência, como as de deputado, médico, advogado, juiz, promotor e outras.
A boa remuneração e os privilégios concedidos aos catedráticos do Atheneu, contudo, não era indicador de que fossem boas as relações do poder público com os trabalhadores no ensino. Fossem eles docentes ou integrantes de outras carreiras servindo ao ensino, o relacionamento era razoavelmente conflituoso. As demandas entre os funcionários públicos das instituições escolares e os governantes da Província terminavam invariavelmente administradas pelos magistrados ou pelo parlamento. Funcionários eram exonerados pelos governantes sem que recebessem o que lhes era devido. Em 1879, Pedro Batista Junqueira, ajudante do arquivo do Atheneu viu aprovada na Assembléia Provincial uma Resolução mandando que o presidente da Província lhe pagasse os créditos aos quais tinha direito desde o dia da sua exoneração como porteiro daquele estabelecimento de ensino (FRANCO, 1880, 135). Idêntica, no ano seguinte, fora a situação do professor Ignácio de Souza Valadão, que também somente veio a receber o pagamento pelos seus serviços como secretário das Escolas Normais referentes ao período de primeiro de junho de 1878 a primeiro de abril de 1879, por determinação de ato parlamentar (FRANCO, 1880, 138).
Tal como fora prática corrente no Atheneu, desde a sua fundação, a Escola Normal de Aracaju adotou uma estrutura hierárquica a partir de 1916 que estabeleceu a cisão dos professores em dois grupos: os catedráticos e os adjuntos. O cargo de professor adjunto foi criado pelo presidente Oliveira Valadão. A sua Mensagem de 20 de junho de 1916 explicita o papel do professor adjunto:


Julguei de utilidade para as disciplinas mais importantes, a criação de lugares de professores adjuntos, que auxiliarão os catedráticos em todos os seus deveres e atribuições e os substituirão nos impedimentos e faltas, com a necessária competência e sem que haja interrupção na seqüência e desenvolvimento do ensino (VALADÃO, 1916, 12).


Era função do professor adjunto auxiliar o catedrático nas suas atividades docentes. “Muitas normalistas depois de formadas iniciaram suas carreiras profissionais como professoras adjuntas” (FREITAS, 2003a, 106). Há muitos documentos oficiais que dão conta das reivindicações para a admissão de professores adjuntos na Escola, como a Mensagem do ano de 1927, encaminhada ao parlamento estadual pelo presidente Manoel Corrêa Dantas. Ele chama a atenção para a necessidade de uma professora adjunta de Aritmética, tendo em vista o excessivo número de aulas e a necessidade de substituição adequada:


A cadeira de Aritmética, lecionada em 3 anos, ressente-se da falta de uma professora adjunta. Não é justo que a maioria dos professores dê 6 aulas por semana e a de Aritmética 9. Além disso há o inconveniente das substituições por professores alheios ao programa em pratica pela catedrática, quando impedida (DANTAS, 1927, 11).

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