domingo, 25 de julho de 2010

REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA DA MEDICINA EM SERGIPE - II

O mais grave problema a preocupar as autoridades e os profissionais da Medicina em Sergipe durante o século XIX foi o das epidemias. O próprio presidente da Província, InácioBarbosa, que promoveu a mudança da capital de São Cristóvão para Aracaju, morreu eu Estância, no dia seis de outubro de 1855, vitimado pela febre palustre, a malária. Em 1849, a febre amarela atacou Sergipe, o Rio de Janeiro e outras Províncias. Em Sergipe, a situação foi mais grave em Itabaiana: “Pode-se dizer na história de Itabaiana, que 1849 foi o ano terrível. Com efeito foi nele que passou pela primeira vez e última pelas suas habitações como por toda Província, o flagelo da febre amarela, que dizimou grande parte de sua população” (LIMA Junior, Carvalho, 1914: 146). Uma outra epidemia matou 228 pessoas em Lagarto e 70 em Itabaiana, todos atacados de disenteria, nos meses de junho e agosto de 1853. O atendimento em Lagarto ficou sob a responsabilidade do Provedor de Saúde, Joaquim José de Oliveira , enquanto o atendimento em Itabaiana foi entregue ao médico Manoel Simões de Mello.
Quando, no século XIX, a Província de Sergipe começou a viver os problemas causados pelo colera-morbus, a carência de profissionais médicos ganhou maior visibilidade. A epidemia que ocorreu a partir de 1855 foi um importante problema de saúde pública, principalmente quando se considera que “em pouco mais de três meses morreram vitimados pela moléstia mais de 30 mil sergipanos, numa população em torno de 200 mil habitantes” (SANTANA, 1997, 12). A doença chegou a Sergipe através da Bahia e atacou inicialmente na vila Nossa Senhora dos Campos do Rio Real (atualmente, a cidade de Tobias Barreto). O terceiro vice-presidente da Província, José da Trindade Prado, que se encontrava no exercício do governo, em face da doença do presidente Inácio Barbosa, determinou que as embarcações procedentes dos portos onde houvesse a epidemia deveriam permanecer em quarentena depois que chegassem a Sergipe. A impossibilidade de execução da medida levou a que se determinasse a proibição da entrada de tais embarcações nos portos sergipanos.


Outra medida tomada foi a nomeação de uma comissão de três médicos, um para Estância, o Provedor da Saúde, Dr. Joaquim José de Oliveira, outro para São Cristóvão, o Dr. Francisco Sabino Coelho Sampaio; e um último para Aracaju, o Dr. José Antonio de Freitas Júnior, que seriam responsáveis pelas medidas de prevenção (SANTANA, 1997: 34).


Para atender a população da vila de Campos foi designado o médico Antonio da Silva Daltro; para a vila de Lagarto, Pedro Autran da Mata Albuquerque e Manoel Antunes de Salles; para Riachão, Francisco Jacinto da Silva Coelho; para Laranjeiras, Francisco Alberto de Bragança e José Cândido de Farias; para o distrito de Lagoa Vermelha (atualmente, a cidade de Boquim), o acadêmico de Medicina José Lourenço de Magalhães. Dois médicos recusaram a nomeação para Maroim: João de Carvalho Borges e Thomaz Diogo Leopoldo, sendo então designado o médico Valois Galvão, inicialmente nomeado para Santo Amaro. Esta cidade recebeu, então, o acadêmico de Medicina José Ignácio Barros Pimentel. O Porto das Redes, distrito de Santo Amaro, recebeu o médico Galdino de Carvalho Andrade. Rosário não conseguiu um médico sequer para tratar do cólera. Rosendo Constâncio de Souza Brito, morador da cidade, fugiu, enquanto João Ferreira da Silva recusou a nomeação. O médico José Cupertino de Oliveira Sampaio não aceitou a nomeação para Divina Pastora, sendo então designado Tobias Rebelo Leite. O responsável pelo atendimento em São Cristóvão foi o médico Francisco Sabino Coelho de Sampaio, enquanto em Itaporanga atendia Pedro Romão Borges de Lemos. Em Aracaju, atuavam os médicos Guilherme Pereira Rebello e José Antonio de Freitas Junior. Em Itabaiana atuou, inicialmente, Manuel Simães de Mello até que a sua família também adoecesse e fosse substituído por Tobias Rebelo Leite. Em Estância, eram três os médicos em atuação: Constantino José Gomes de Souza, Joaquim José de Oliveira e Antonio Ribeiro Lima (SANTANA, 1997: 37-39).
Quando o primeiro vice-presidente da Província, João Gomes de Mello, o Barão de Maroim, retornou do Rio de Janeiro e assumiu o governo, em 25 de setembro do mesmo ano de 1855, mandou reabrir os portos. Àquele momento a doença já havia se alastrado por todas as cidades, vilas, aldeias, arraiais, lugarejos, portos e estradas. O Barão mandou construir lazaretos para abrigar os pobres e indigentes acometidos pela enfermidade. O quadro de pânico era geral: faltavam médicos, medicamentos e alimentos para atender as populações das cidades mais importantes; as autoridades, com medo, abandonavam os seus cargos e fugiam para locais isolados; faltavam alimentos na Província; o presidente de Sergipe em exercício, o Barão de Maroim, pediu ajuda aos governos das Províncias de Pernambuco e da Bahia. O governo de Pernambuco enviou uma pequena quantidade de medicamentos. O governo da Bahia mandou, em novembro de 1855, um navio com remédios e os médicos Tristão Henrique Costa e João Francisco de Almeida, além dos acadêmicos de Medicina Bemvenuto Pereira do Lago, João Ribeiro Sanches, Leandro Carlos de Sá, Cândido do Prado Pinto e Manoel Francisco Teixeira.
Além da ajuda das Províncias de Pernambuco e da Bahia, o governo de Sergipe recebeu também o auxílio da Junta Central de Higiene do Império, que enviou do Rio de Janeiro mais medicamentos e dois médicos: Tobias Ferreira Leite e Augusto Francisconi. O primeiro era um sergipano residente no Rio de Janeiro, que se apresentou para trabalhar gratuitamente. O segundo foi contratado por determinação do ministro do Império.
Como conseqüência da epidemia de cólera que assolou Sergipe em 1855, no ano seguinte os médicos Guilherme Pereira Rebelo e Pedro Autran da Mota Albuquerque, por solicitação do presidente da Província, Salvador Correia de Sá e Benevides, produziram um estudo sobre as condições de salubridade da cidade de Aracaju. Sugeriram que o maior problema sanitário da nova capital eram os seus pântanos, propondo o aterro e o esgotamento destes, o fornecimento de água potável, “a remoção do matadouro do centro da cidade, a proibição dos enterramentos nas igrejas e o enfrentamento da questão das imundícies (lixo) dos centros urbanos” (SANTANA, 1997: 43).
Em 1855, a cidade era abastecida por duas fontes de água potável, vermelha, considerada de qualidade ruim: a Fonte do Caboclo e a Fonte da Nação. Depois foi descoberta a Fonte do Mané Preto, que fornecia uma água branca, transparente, considerada de qualidade muito boa (CHAVES, 2004: 75). A qualidade da água potável existente foi objeto da reclamação de alguns viajantes europeus. Ave-Allemant reclamou da falta de uma boa água potável na cidade: “a que se tem para beber é ruim, amarela cor de ouro” (AVÉ-ALLEMNAT, 1961). À água atribuiu as febres intermitentes que o acometeram em Aracaju. Em 1856, o presidente da Província, Salvador Correia de Sá e Benevides, determinou a abertura de três novas fontes públicas para o consumo de água potável em Aracaju e adquiriu uma bomba hidráulica no Rio de Janeiro, objetivando a proteção desses mananciais. Além disso mandou recolher amostras da água existente nas fontes que abasteciam Aracaju e as encaminhou para a cidade de Salvador, a fim de que estas fossem submetidas a análise química, constatando a má qualidade da água consumida na capital da Província. O problema havia melhorado bastante no final do século XIX, com a construção de chafarizes em vários locais da cidade, que armazenavam água de poços extraída através da força de cataventos e armazenada para distribuição às pessoas.

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