quinta-feira, 29 de julho de 2010

REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA DA MEDICINA EM SERGIPE - VI

Como resultado dos contatos entre o presidente de Sergipe e o médico Carlos Chagas, em março de 1923 o governo estadual transferiu para o Departamento Nacional de Saúde Pública a direção dos serviços sanitários do Estado, criando o Serviço de Saneamento e Profilaxia Rural, subordinado ao Departamento Nacional de Saúde Pública. Na mesma oportunidade, os órgãos de assistência pública foram transferidos para a Intendência Municipal e o Serviço de Assistência aos Mortos retornou para a Diretoria de Segurança Publica. Foram também criados o Posto Oswaldo Cruz, em Própria, e o Posto Belisário Pena, em Estância. Além disso, foi instalada a Seção de Lepra e Doenças Venéreas (SANTANA, Antonio Samarone de. As febres do Aracaju: dos miasmas aos micróbios. São Cristóvão: Universidade Federal de Sergipe,1997. [Dissertação de Mestrado]. p. 164).
Em 1924 a cidade de Aracaju ganhou o seu Serviço de Assistência Médico Cirúrgica de Urgência, equipado com uma ambulância para o socorro dos acidentados. Além disso, o Sub-posto de Higiene do Batalhão Policial entrou em funcionamento, com o objetivo de tratar das doenças venéreas dos soldados e praças. Foram iniciadas ainda as atividades de postos e sub-postos de higiene no Centro Agrícola Epitácio Pessoa e nos municípios de Própria, Estância, Anápolis, São Cristóvão, Laranjeiras, Itaporanga d’Ajuda, Japaratuba, Santa Luzia, Vila Nova e Lagarto.
No Serviço de Saneamento e Profilaxia Rural em Sergipe começaram a funcionar a Seção de Endemias e Epidemias Rurais, o Dispensário Maternal de Higiene Infantil, o Serviço de Proteção à Infância, Pré-natal e Assistência à Gestante, a Farmácia Popular, o Dispensário de Lepra e Doenças Venéreas, a Seção de Fiscalização de Gêneros Alimentícios e a Seção de Propaganda e Educação Sanitária.
Em 1926, uma reforma administrativa na área de saúde aprovou um Código Sanitário e criou a Diretoria Geral do Serviço Sanitário. A nova diretoria era constituída por uma Seção de Endemias, Epidemias e Estatística Demógrafo-Sanitária; uma Seção de Polícia Sanitária e uma Seção de Assistência Individual. Foi criado, novamente, o Conselho Sanitário Central, tendo como integrantes o diretor geral do Serviço Sanitário, os delegados sanitários dos municípios, o Intendente Municipal de Aracaju, o professor de higiene da Escola de Farmácia e Odontologia Aníbal Freire, os diretores do Instituto Parreiras Horta e Arthur Bernardes, do Hospital de Cirurgia e os médicos do Batalhão da Força Federal e da Polícia Militar do Estado.
O Instituto Parreira Horta foi fundado em 1923, com o objetivo de pesquisar e produzir insumos básicos para a área de saúde. A pretensão era construir uma instituição voltada ao combate à raiva; um instituto vacinogênico capaz de produzir vacina anti-variólica; e, um laboratório de análises clínicas, bacteriológicas e químicas que também funcionasse como centro de pesquisa médica. O presidente Graccho Cardoso entregou a responsabilidade pela instituição ao médico Paulo de Figueiredo Parreira Horta.Ele cuidou pessoalmente do projeto, da construção e da organização administrativa e científica do Instituto. Cientista de prestígio internacional, ao transferir-se para Sergipe viveu como hóspede oficial do Palácio do Governo. O edifício do Instituto foi erguido em oito meses e inaugurado em maio de 1924 (SANTANA, Antonio Samarone de. As febres do Aracaju: dos miasmas aos micróbios. São Cristóvão: Universidade Federal de Sergipe,1997. [Dissertação de Mestrado]. p. 177-178).
Para o pesquisador Antônio Samarone de Santana, o século XIX foi o período no qual o conhecimento médico adquiriu efetivamente o status de conhecimento científico ao qual se conferiu distinção social elevada, fazendo com que muitos filhos da elite de Sergipe optassem pela carreira médica, “como forma de prestígio e poder” (SANTANA, Antonio Samarone de. As febres do Aracaju: dos miasmas aos micróbios. São Cristóvão: Universidade Federal de Sergipe,1997. [Dissertação de Mestrado]. p. 81). Santana incorpora a interpretação de Michel Foucault, segundo a qual nos anos 800 o conhecimento médico foi assumido como prática profissional organizada nacionalmente, buscando um tipo de status profissional assemelhado ao do clero, fazendo com que os profissionais da saúde pudessem exercer sobre a saúde do corpo influência análoga àquela que os padres exerciam sobre o cuidado com a alma (FOUCAULT, 1977: 35).
Mesmo podendo a Província de Sergipe contar com aqueles que se formavam na Faculdade de Medicina da Bahia, em torno da metade dos anos 800, existiam em atuação apenas 24 médicos e nove farmacêuticos. Naquele momento já existia, da parte do governo, uma maior preocupação com o controle do exercício profissional da Medicina. Os profissionais da saúde estavam subordinados aos ditames do Regimento Imperial de 28 de setembro de 1851 e deveriam providenciar registro junto à Provedoria, o que foi cobrado pelo governo provincial a partir de 1859. Contudo, desde 1852 o Código de Posturas de São Cristóvão exigia que todo médico ou boticário em atuação registrasse a sua Carta na Câmara Municipal.
Já sob o regime republicano, após a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública, quando da implantação em Sergipe do Serviço de Saneamento e Profilaxia Rural, em 1923, o diretor deste novo órgão determinou que todos os médicos, dentistas e farmacêuticos registrassem os seus diplomas na repartição.
O saber médico em Sergipe, durante o século XIX, contou com muitos intelectuais que se dedicaram o seu trabalho a pesquisar esta área. Dentre estes ganha relevo Manuel Ladislau Aranha Dantas, primeiro intelectual nascido em Sergipe a obter um diploma de médico pela Faculdade de Medicina da Bahia, na qual, posteriormente, viria a ser também professor. Mas, certamente, o médico Francisco Sabino Coelho Sampaio foi o intelectual e político da área médica mais importante em Sergipe durante a segunda metade do século XIX. Ele exerceu controle sobre o saber médico, ocupando durante 37 anos, de 1843 a 1880, os cargos de Vacinador Geral, Provedor de Saúde Pública, Inspetor de Saúde Pública, Comissário Vacinador, Inspetor do Porto e médico do Hospital Nossa Senhora da Conceição (SANTANA, Antonio Samarone de. As febres do Aracaju: dos miasmas aos micróbios. São Cristóvão: Universidade Federal de Sergipe,1997. [Dissertação de Mestrado]. p. 79-80).

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