quinta-feira, 22 de julho de 2010

SOBRE A HISTÓRIA DO CONHECIMENTO MATEMÁTICO EM SERGIPE - II

A primeira preocupação que tinham os autores era a de “satisfazer as exigências da didática moderna” (OLIVEIRA e BITTENCOURT, 1897: I). Para tanto, partiram do pressuposto de que o conhecimento da Matemática, como de resto das demais ciências, requer o seu estudo em quatro partes: teórica, prática, filosófica e histórica. Com base em tal pressuposto, fizeram uma crítica rigorosa dos livros de Matemática em circulação no Brasil, dizendo que nestes “a parte prática vem confundida com a teórica, trazendo estas noções filosóficas e históricas, tudo sem distinção” (OLIVEIRA e BITTENCOURT, 1897: II). Sob o espírito dessa crítica, apontaram erros cometidos, inclusive, por adeptos ortodoxos da doutrina Positivista, “esses senhores (...) absolutamente despidos de senso crítico” (OLIVEIRA e BITTENCOURT, 1897: V), não obstante serem também os dois autores filiados ao Positivismo. Contudo, afirmaram que aqueles aos quais classificaram de positivistas ortodoxos


procuram na prática reagir contra semelhantes prejuízos, limitando a parte teórica ao estritamente necessário, e fazendo realçar bem a parte filosófica. Mas ainda assim erram crassamente na colocação desta última, pois fazem-na preceder a todas as outras, dando por esta forma péssima interpretação ao que escreveu Augusto Comte (OLIVEIRA e BITTENCOURT, 1897: III).
As críticas que os dois autores dirigiram a outros estudiosos causaram estranhamento em muitos deles. Licínio Cardoso, catedrático de Mecânica da Escola Politécnica do Rio de Janeiro e lente de Sociologia da Escola Militar, também no Rio, não obstante haver elogiado muito o trabalho, foi contundente ao divergir:


Não posso, todavia, falar sem restrições do vosso trabalho: penso que há aí algumas lacunas oriundas certamente da falta de prática no ensino, e de vossa pouca idade. Considerações e definições que não me parecem aceitáveis são freqüentes; neste caso estão: os conceitos sobre grandeza à pág. 9; sobre número, pág. 10; sobre grandezas contínuas e descontínuas, pág. 11; a nota à pág. 12; noção de número concreto, pág. 16; definição de numeração, pág. 17; princípios da numeração, pág. 19 e 23 etc. estas lacunas correspondem: uma, a defeito de definição – outras a espécie de arrogância, com a qual argüis de erro noções geralmente aceitas (OLIVEIRA e BITTENCOURT, 1897: XI).


O trabalho de Samuel de Oliveira e Liberato Bittencourt apresenta na parte que os autores chamaram de teórica as diversas teorias que eles selecionaram para o estudo, mencionando a importância e a utilidade de cada uma delas. Combateram noções que consideraram equivocadas e criticaram de modo contundente a chamada “teoria dos restos”.


Sabe-se, com efeito, que cada princípio de divisibilidade dá lugar a uma conseqüência imediata e que é relativa a determinação do resto da divisão de um número inteiro qualquer pelo divisor de que se trata. Pois bem: os compendiadores em sua totalidade formam com essas conseqüências a famosa teoria dos restos, apresentando assim ao mundo científico o fato grotesco de uma nova teoria composta pura e exclusivamente de conseqüências deduzidas dos princípios de outra teoria!... (OLIVEIRA e BITTENCOURT, 1897: IV).


Após a exposição das operações sobre os números inteiros no sistema de numeração universal, os autores as generalizaram para uma base qualquer e fizeram logo extensão ao caso das frações ordinárias e decimais.
A parte do livro a qual chamaram de prática ficou restrita, no dizer dos autores, àquilo que era necessário para o esclarecimento da parte doutrinária da ciência, como também para a solução dos problemas ensejados por esta em suas numerosas aplicações. Quanto a chamada parte filosófica, foram feitas apreciações de compreensão simples, mesmo para aqueles cujos conhecimentos estão limitados ao domínio aritmético. Por último, o livro apresenta uma breve História da Aritmética, em poucas páginas.
Os autores esclarecem que no processo de elaboração da Matemática Elementar fizeram a opção de desconsiderar a Síntese Subjetiva de Comte:


Por maior que seja a admiração que temos por Augusto Comte, por maiores que sejam as homenagens que rendemos à brilhante orientação que o poderoso gênio do grande filósofo imprimiu aos estudos matemáticos, não podemos deixar de reconhecer que uma aritmética confeccionada de acordo com as vistas expostas na Synthèse Siubjective só pode prestar serviços a quem já possua conhecimentos regulares sobre a ciência, que não aqueles que apenas começam a entreter relações com as questões numéricas (OLIVEIRA e BITTENCOURT, 1897: V).


Apanham como mau exemplo o trabalho de Pierre Laffitte, Cálculo Aritmético, que consideram um grande fiasco. Dizem que o livro de Laffitte como obra didática é um grande desastre e um menosprezo à Metodologia, responsabilizando a Síntese Subjetiva por tais problemas.
Em Sergipe, no início do século XX os estudos de Matemática tiveram uma importante liderança, depois que o professor Abdias Bezerra assumiu, em 1911 as cadeiras conjuntas de Aritmética e Álgebra do Atheneu Sergipense. Em 1915, ainda na mesma instituição, esse professor era responsável pelo ensino de Geometria e Trigonometria.
Wagner Valente (1999) afirma que no período de 1730 a 1930 o Brasil viveu sob a Matemática escolar clássica ou tradicional. Segundo Ângela Miorim (1995) a década de 30 do século XX no Brasil foi marcada pela reforma Francisco Campos e os seus pressupostos escolanovistas, enquanto a década de 60 se conheceu o movimento em defesa da chamada Matemática Moderna.
Na década de 30 do século XX o Brasil conheceu as suas primeiras faculdades de Filosofia, Ciências e Letras destinadas a formar professores para o ensino secundário. A partir de 1939 ocorre a consagração do conceito Licenciatura, tal como entendido até os dias atuais (TANURI, 1983).

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